Mas em 2026 devem ser também comemorados os 190 anos da reforma territorial dos municípios publicada pelo Decreto de 6 de Novembro de 1836 e também da entrada em vigor do primeiro Código Administrativo de Portugal publicado por Decreto de 31 de Dezembro de 1836. Esta importante reforma territorial dos municípios, bem como o subsequente Código Administrativo, têm o nome de Passos Manuel, importante político do século XIX.
Erradamente costuma atribuir-se a reforma dos municípios a Mouzinho da Silveira com o seu muito importante Decreto de 23 de Maio de 1832, mas este diploma, para além de separar claramente o poder de administrar do poder de julgar (e é esse o seu grande mérito), dividiu administrativamente o país em 8 províncias, 40 comarcas e concelhos, mantendo o seu número, que era de cerca de 800 no continente.
Passos Manuel, quatro anos mais tarde, fez uma profunda reforma territorial dos municípios, diminuindo o seu número, e dividiu administrativamente o país em distritos (17 – o de Setúbal foi criado muito mais tarde), concelhos (351) e freguesias (mais de 4.000 correspondendo às paróquias religiosas, mas tendo uma junta eleita pelos residentes da freguesia).
A reforma territorial dos concelhos foi um acto político audacioso que Passos Manuel levou a cabo. Este político foi sensível à crítica que se fazia, desde 1820, de existirem no país centenas de pequenos municípios com muito pouca população e território e que isso era mau para a boa administração do país e o critério que adoptou foi muito claro: nem concelhos demasiado pequenos, pois não teriam recursos financeiros para cumprir as suas missões, nem sequer pessoas capazes para serem eleitas, nem concelhos demasiado grandes, pois seriam difíceis de administrar e dificultariam o acesso dos moradores à sede do concelho para cumprir os seus deveres.
Não foi fácil fazer esta reforma, pois as resistências dos concelhos a ser extintos seriam grandes, mas Passos Manuel aproveitou o momento revolucionário de Setembro desse ano para decretar sem demora uma divisão que andava a ser preparada pelo Coronel Franzini, um qualificado conhecedor do país, particularmente dedicado à estatística e a ciências que emergiam na época.
Foi uma reforma pioneira, pois foi seguida, passado mais de um século, por vários países do Norte da Europa, com grande número de municípios, no fim da Segunda Guerra Mundial (entre outros, Bélgica, Dinamarca, Suécia e Alemanha Ocidental) e pelas mesmas razões que nortearam a nossa reforma.
É certo que a Espanha, França e Itália não seguiram esse caminho, mas a enorme quantidade de municípios que possuem é um entrave à boa administração municipal. Muitos, mas muitos mesmo, desses municípios são mais pequenos do que as nossas freguesias e em todos eles, especialmente na França, houve tentativas de diminuição do número desses municípios, mas sem êxito.
Pena foi que a nossa reforma das freguesias feita em 2013 não tivesse seguido um critério semelhante, pois hoje teríamos um mapa de freguesias bem melhor. O critério de reforma por cortes percentuais foi muito pouco racional.
De notar que, destes, o de Vila Nova de Famalicão nasceu com esta reforma (Barcelos era um concelho muito grande) e os de Penela, Pico de Regalados e Prado foram posteriormente extintos. Por sua vez, em meados do século XIX, foi criado o município de Vila Verde (1855) e, já depois de 25 de Abril, o de Vizela (1998).
Uma nota final para dizer que esta reforma e o seu critério enraizaram-se no país e durante o século XIX, com muita sabedoria política, o número de municípios foi ainda diminuindo, sendo hoje 278 no continente.
(Em Diário do Minho, 26/12/25)