É preciso dizer e repetir que um dos grandes êxitos do regime democrático em que
vivemos é o facto de o resultado das eleições que realizamos periodicamente não ser objecto
de discussão. O que se discute é o significado desse resultado. Uns consideram-no muito bom
(vitória, nos casos mais claros) outros, menos bom, mas sempre aceitando os resultados
anunciados e publicados.
Nunca essa lisura do acto eleitoral aconteceu na história do nosso país desde que as
eleições se começaram a fazer em mesas eleitorais espalhadas pelo país, há pouco mais de 200
anos. A regra era a de quem perdia logo proclamava que houve fraude, que os resultados
foram viciados e bem sabemos que tal sucedia, desde logo na elaboração dos cadernos
eleitorais e depois, nas mesas de voto.
Em Portugal, desde 1975, as eleições são principalmente da responsabilidade de uma
entidade independente - a Comissão Nacional de Eleições (CNE) - e as mesas de voto são
organizadas de modo a que delas façam parte pessoas idóneas e o acto eleitoral seja
devidamente fiscalizado por representantes dos partidos concorrentes. Certamente nem tudo
é perfeito, existem problemas, mas há confiança nos resultados anunciados pelas mesas e
depois publicados nos lugares próprios.
Isso deve ser motivo de orgulho para todos nós. Merecem inegável elogio os membros
das mesas de voto, que estão ali um dia inteiro, a troco de uma pequena compensação
financeira (senha). Manter este nível não é fácil e, no dia em que não confiarmos nas mesas de
voto, a honestidade cívica desaparece e com ela a democracia.
A boa preparação do acto eleitoral deve também muito ao dia de reflexão previsto na
lei. A acalmia do dia anterior, em que a campanha eleitoral já terminou, permite preparar as
mesas de voto e o dia de eleições com a serenidade necessária.
Acresce que os candidatos, por sua vez, têm um dia de descanso para no dia seguinte
poderem falar mais ponderadamente. E a que título se menospreza o direito dos cidadãos de
pensarem sobre a decisão de voto num ambiente calmo que esse dia proporciona?
E, a este propósito, não se esqueça de votar. O boletim de voto permite todas as suas
preferências, mesmo quando nenhuma das listas lhe agradar. Para isso, há o voto branco ou o
voto nulo. O voto nulo permite até, se assim se entender, riscar todo o boletim ou escrever
nele o que se pensa.
O dia de voto é um dia de festa democrática em que as pessoas se encontram e o voto
presencial tem uma transparência que nenhum outro modo de votar possui.
(Publicado no JN de 6 de março de 2024)