sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

A descentralização territorial de 2018

Em 26 de janeiro do presente ano de 2018, o Presidente da República fez, na abertura do Congresso da ANAFRE, uma intervenção da qual relembramos aqui duas passagens (o texto completo está disponível no site da Presidência).
Uma, relativa especificamente às freguesias, defendendo que todas as freguesias e desde logo as mais pobres devem possuir um “mínimo incompressível” de recursos financeiros sem o qual não é possível viver. Comparou mesmo com o mínimo que as pessoas precisam para viver com dignidade. A lei das finanças locais que está em preparação deve ter isso em conta.
Outra relativa ao debate sobre a descentralização, afirmando que estamos a entrar num período em que ela vai ocupar um lugar cimeiro no debate político no nosso país.
É tema, disse, para os próximos seis meses (até ao verão, portanto), um período muito curto por duas razões que enunciou.
Por um lado, o próximo ano é eleitoral (eleições para o Parlamento Europeu e para a Assembleia da República), e por isso não é tempo propício a debate e a consensos e, por outro lado, é preciso desde já equacionar, ao mesmo tempo, a descentralização, o ordenamento do território e o programa 2030, que está a chegar. Frisou que estas questões (descentralização, ordenamento do território e programa 2030) não são separáveis, devendo ser debatidas conjuntamente e que urge dar-lhes resposta.
Advertiu que a sociedade portuguesa não pode descobrir de repente, no próximo ano, que a Europa está a discutir e votar o quadro financeiro plurianual (programa 2030) e que a atual comissão europeia vai cessar funções deixando, entretanto, aprovadas as grandes prioridades para além de 2021, sem que nos tenhamos apercebido disso, preparando-nos devidamente.
Temos desigualdades territoriais que urge combater e o debate da descentralização não pode passar ao lado desta questão, acrescentou.
O Presidente da República considera que há condições para um debate frutuoso e para a consequente tomada de decisões e que Portugal não pode esperar mais para dar um passo que será histórico em termos de descentralização.
Não foi esta a primeira vez que o Presidente se referiu a estas questões e não lhe poderá ser atribuída responsabilidade pelas falhas que ocorrerem.
Cabe aos partidos na Assembleia da República, superando as suas diferenças, encontrar soluções boas para o nosso país. Cabe-lhes a responsabilidade de elaborar as leis de descentralização de 2018.
  

(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 16-02-2018)

quinta-feira, 8 de fevereiro de 2018

Congresso da ANAFRE

Foi aprovado por unanimidade, no XVI Congresso da ANAFRE, realizado em Viseu, nos dias 26. 27 e 28 de janeiro de 2018, com a participação de mais de um milhar de eleitos de freguesias, um importante documento intitulado “Linhas Gerais de Atuação”, que aborda os seguintes capítulos: (I) autonomia do poder local; (II) reorganização administrativa; (III) Lei das Finanças Locais; e (IV) estatuto do eleito local. Deste extenso documento, que se encontra publicado na página da ANAFRE (www.anafre.pt), respigamos apenas alguns pontos que julgamos de particular interesse.

No capítulo I, reafirma-se a autonomia das autarquias locais consagrada na Constituição, rejeitando-se qualquer interferência do poder central nas freguesias, que não seja de mera tutela administrativa de legalidade, recusando qualquer tutela de mérito.

No capítulo II, sobre a reorganização administrativa, a ANAFRE defende a aprovação de uma Lei-Quadro, relativa à criação, modificação e extinção das autarquias locais, que deve ter em conta a vontade das populações, permitindo a reposição das freguesias extintas contra a sua vontade.

No que toca ao capítulo III, sobre finanças, a ANAFRE defende uma justa repartição dos custos públicos e um consequente aumento do Fundo de Financiamento das Freguesias (FFF), com vista à execução das suas atribuições e competências. A este propósito muito se falou e concordou com aquilo que se pode chamar um mínimo de subsistência para as freguesias com recursos muito escassos.

No que respeita ao estatuto dos eleitos locais (capítulo IV), a ANAFRE defende o alargamento do regime de permanência e de meio tempo, e sugere regras de instalação dos órgãos das freguesias que ultrapassem os impasses atualmente existentes.

Neste congresso foram ainda aprovadas com larga maioria 21 moções, que podem ler-se na página da ANAFRE (secção de destaques), abordando diversos temas, de entre os quais se destaca  a defesa de serviços públicos de atendimento próximos das populações, como por exemplo os CTT; a possibilidade de o presidente da junta constituir o executivo na primeira assembleia de freguesia posterior às eleições, evitando os problemas atualmente existentes; a regularização do pessoal das freguesias; a possibilidade,  no âmbito de nova lei-quadro sobre a criação, modificação e extinção das freguesias, de “reversão simplificada” de agregações  atualmente  existentes, sempre que haja acordo entre os órgãos locais e que as freguesias a desagregar continuem a manter “os requisitos médios das freguesias portuguesas em termos de área e de população”. Várias dessas moções apelavam também à criação de regiões administrativas, conforme previsto na Constituição.
                                                                      
PS -  O Professor Catedrático Jubilado do Instituto de Ciências Sociais da Universidade do Minho, Manuel da Silva e Costa, que faleceu esta semana em Ribeirão - Vila Nova de Famalicão, desempenhou um importante papel na construção da Universidade do Minho tal como a conhecemos hoje, que importa aqui recordar.  

 (Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 8-02-2018)

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018

Subfinanciamento crónico

Uma capa de conceituada revista sobre o ensino superior apresentava o seguinte título, em forma de queixa - e, diga-se, com toda a razão -: “Subfinanciamento Crónico”.
Referia-se, é claro, ao financiamento das instituições de ensino superior e, assim, das universidades e dos institutos superiores públicos.
Mas, se bem repararmos, a queixa é muito generalizada.
De subfinanciamento crónico, queixam-se também as autarquias locais que invocam - e com razão - o facto de nem sequer se cumprir o que determina a lei das finanças locais.
De subfinanciamento queixam-se fortemente os hospitais e, em geral, todo o serviço nacional de saúde.
E os tribunais? Que dizem eles senão que o financiamento do poder judicial não é o suficiente, chegando-se a insinuar, por vezes, que assim é por vontade do governo.
E o que dizem as forças policiais (GNR, PSP, SEF) chamadas a garantir a importante missão de segurança das pessoas? Não invocam a falta de meios financeiros?
E os serviços de inspeções, que tão necessários são para garantir o bom funcionamento da máquina administrativa na prossecução do interesse público: não é de falta de financiamento que se queixam, dizendo, por exemplo, que nunca se preenche devidamente o quadro de pessoal?
Por sua vez, não temos todos presente a falta de meios para desenvolver uma boa política florestal e para lutar contra a calamidade dos incêndios?
Haverá algum serviço público que se queixe – sem razão – de subfinanciamento crónico?
Mas se assim é, então financie-se devidamente todos esses serviços! É nesta altura que alguém–  alguém de bom senso -  dirá que não somos um país rico que tal permita, mesmo recorrendo ao crédito e aumentando o défice. A solução tem de passar por nos habituarmos a viver com dificuldades, sem prejuízo de se melhorar o financiamento público, na medida do que é financeiramente suportável, e fazendo a melhor gestão possível, tendo em conta as devidas prioridades.
E é em termos de prioridades que há mais divisões, pois dificilmente algum serviço público dirá que deve abdicar de meios em favor de outro, ainda que bem saiba que o Estado (com os impostos que pagamos e que achamos já muito pesados) não pode acorrer a tudo.

  (Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 1-02-2018)