quinta-feira, 14 de fevereiro de 2019

Referendo Municipal em Braga?

Em Portugal, usamos pouco o referendo local e é pena (estão registados 5, até agora, na página da Comissão Nacional de Eleições).

Este referendo existe na Constituição da República Portuguesa desde 1982 (atual artigo 240.º) e na lei (Lei Orgânica n.º 4/2000, de 24 de agosto) para possibilitar aos cidadãos eleitores tomar uma decisão sobre “questões de relevante interesse local”, em vez dos órgãos eleitos.

O município poderá, assim, perante uma questão difícil, ouvir os munícipes e deverá mesmo obedecer à vontade que resultar do referendo se este for vinculativo (participação de mais de 50% dos eleitores), em vez de decidir através da câmara e da assembleia municipal eleitas. Podem votar os cidadãos eleitores recenseados na área do município em causa.

Acaba de ser anunciada, pelo presidente da Câmara Municipal de Braga, a intenção de submeter a referendo a questão do Estádio Municipal de Braga. Este equipamento foi construído por ocasião da organização por Portugal da competição futebolística que teve o nome de “Euro 2004” e, na mesma altura, foram construídos ou beneficiados um conjunto de outros estádios do Minho ao Algarve.

O Estádio de Braga tornou-se muito conhecido pelo seu aspeto arquitetónico, mas, desde cedo, se verificou que era muito dispendioso. Na ocasião, ele foi, em geral, bem recebido. As despesas, porém, não deixaram de crescer e, ainda hoje, 15 anos depois, o estádio é fonte de graves problemas financeiros que deveriam ser tidos em devida conta na altura da sua construção.

Segundo se depreende, a questão do referendo coloca-se, em termos gerais, do seguinte modo: deve, o município de Braga, manter o estádio, gerindo-o de forma a não causar graves problemas ao erário municipal, ou deve alienar o estádio sem que este deixe de cumprir a finalidade para que foi construído? A resposta não é fácil em qualquer uma das situações e a vantagem do referendo será abrir um largo debate sobre esta questão, com indicação de argumentos num ou noutro sentido. Os bracarenses ficarão a saber muito mais sobre o passado, o presente e o futuro de uma obra que custou e continua a custar largas dezenas de milhões de euros.

A haver referendo a pergunta ou perguntas (até 3) devem ser formuladas com muito cuidado, pois têm de ser submetidas previamente ao crivo do Tribunal Constitucional.

Note-se, a propósito, que um referendo por iniciativa dos órgãos locais é muito mais fácil do que por iniciativa dos cidadãos, sendo a lei excessivamente exigente quanto a estes.

Este referendo, aliás, terá seguramente repercussão nacional, pois outros municípios há que se defrontam com problemas de difícil solução e que deveriam consultar os cidadãos. Existe aqui uma oportunidade de dar ao referendo local o lugar que ele deve ter, valorizando a nossa democracia, que é representativa, mas também é participativa.

(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 14-2-2019) 

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2019

A prestação de contas pelo Presidente da Câmara Municipal

Os presidentes dos municípios têm de prestar contas à assembleia municipal nas quatro sessões anuais que estão previstas na lei.

Alexandre Soares dos Santos, durante largos anos o “presidente” da Jerónimo Martins, deu uma larga entrevista (“entrevista de vida”) à TVI, no dia 2 de fevereiro de 2019, que merece ser vista e ouvida. Dessa entrevista, conduzida pelo Director de Informação da TVI, Sérgio Figueiredo, que tratou muitos assuntos, retiramos o momento em que o entrevistado sugeriu que os “presidentes” dos municípios fizessem, mensalmente, uma prestação de contas aos munícipes, em espaço aberto ao público.

Esta sugestão merece, a meu ver, uma atenta reflexão. Por um lado, é verdade que já hoje os presidentes dos municíp ios, que são os presidentes das câmaras municipais, têm de prestar contas à assembleia municipal nas quatro sessões anuais que estão previstas na lei (fevereiro, abril, junho, setembro e novembro ou dezembro) ou seja, uma prestação de contas trimestral.

Esse dever de prestação consta da alínea c) do n.º 2 do artigo 25.º da Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro, nos termos da qual compete à assembleia municipal apreciar, em cada uma das sessões ordinárias, “uma informação escrita do presidente da câmara municipal acerca da atividade desta e da situação financeira do município”.

Esta informação deve ser enviada ao presidente da assembleia municipal, com a antecedência mínima de cinco dias sobre a data do início da sessão. A apreciação em causa, incluída na ordem do dia, permite ao presidente da câmara dar conta da atividade realizada e expor a evolução da situação financeira do município, e permite também aos membros da assembleia municipal discuti-la com o presidente. Não permite, no entanto, que sobre ela se pronuncie o público.

A nosso ver, devia dar-se mais importância a esta informação do presidente, dando-lhe um lugar de relevo em cada sessão e deveria permitir-se a intervenção do público, formulando opiniões e mencionando mesmo, se fosse o caso, omissões da mesma. Isto exigiria, no entanto, que as assembleias municipais decorressem num espaço amplo e implicaria também que este ponto da ordem do dia durasse pelo menos uma hora, o que poderia colidir com o tratamento dos demais assuntos da ordem do dia a não ser que a sessão fosse desdobrada em duas reuniões.

Mas Alexandre Soares dos Santos ia mais longe e incentivava , e bem , a presença do presidente da câmara, perante o público em geral em sessões mensais para prestar contas da sua acção. Que dizer sobre isso? É tema para outro texto.

PS - Arrepia ver os enfermeiros usar o bem da saúde das pessoas para alcançar vantagens econó micas.

(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 7-2-2019)