domingo, 6 de dezembro de 2020

A regionalização e o nó que lhe foi dado

Como sabemos há defensores e adversários da regionalização, tendo ambos bons argumentos. Não ter em conta esta coisa tão evidente dificulta tudo. Havendo defensores e adversários, uns e outros têm o direito de defender e lutar pela sua posição, devendo essa luta desenrolar-se com igualdade de armas políticas.

A igualdade de armas exige que o debate e a votação sejam feitos na Assembleia da República, fazendo-se a regionalização apenas se os seus defensores ganharem a votação. Os adversários perdedores poderão, contudo, recorrer, se assim entenderem, ao referendo, mobilizando-se para o efeito e, se o ganharem, o processo não avança.

Porém, não é possível agir, assim, em Portugal nas atuais circunstâncias. Os adversários da regionalização têm, desde 1997, mais armas que os defensores, pois nem sequer precisam de se mobilizar para fazer um referendo. Este foi-lhes oferecido. É o único referendo obrigatório previsto na Constituição e isso faz toda a diferença.

Os defensores da criação de regiões têm de ganhar uma votação no Parlamento e de de seguida ganhar o referendo a nível nacional e a nível regional. Mais. Segundo algumas interpretações não basta ganhar o referendo a nível nacional . É preciso que votem mais de 50% dos eleitores, pois não se trata de um referendo qualquer, mas de um referendo obrigatório. Se a participação for baixa, a vitória não é suficiente. Será o Tribunal Constitucional, interpretando a Constituição, a ter a última palavra.

Ainda mais. Não basta ganhar o referendo a nível nacional, é preciso ganhá-lo em cada região. Se numa determinada região o voto for negativo, a região em causa não é criada. São precisas, pois, duas vitórias: a nacional e a regional.

Nenhum destes trabalhos têm os adversários. Basta-lhes ganhar o referendo a nível nacional e mesmo perdendo-o, ainda podem ter eventualmente a seu favor o Tribunal Constitucional, caso não tenham votado 50% dos eleitores. Vida muito mais fácil, pois.

A primeira luta dos defensores da regionalização deve ser claramente pela igualdade de armas, fazendo-se uma revisão constitucional cirúrgica. A democracia assim o exige. Se não perceberem isto, os defensores da criação de regiões aceitam lutar em desvantagem. Boa sorte!

 

(Artigo de opinião publicado no Jornal de Notícias, de 06-12-2020)