quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Votar? Sim, mas

Somos chamados a votar no dia 4 de outubro de 2015 e em condições normais podemos fazer, nesse dia, uma de duas coisas: votar ou não votar. Todos sabemos que há um grande número de cidadãos que não votam e até há quem lembre que o maior “partido” português é o da abstenção. 
Tenho dificuldade em compreender a abstenção, salvo em caso de impedimento sério, porque o cidadão consciente quer seguramente bons serviços públicos de saúde, educação, justiça e de segurança social e sabe que eles dependem de um bom governo do país. Querer esses bens , e ao mesmo tempo não votar , é algo que custa a aceitar.
Repare-se, por outro lado, que a abstenção não é um partido. A abstenção é, fazendo uma comparação, um saco onde se misturam nomeadamente aqueles que têm um desinteresse absoluto pela política (embora queiram os serviços públicos a funcionar bem ), os que não votam por preferirem dar um passeio ou ir ao futebol (não compreendo esta desvalorização do ato eleitoral, marcando jogos para o dia das eleições), os que não votam por impedimento sério (emigração, doença ou outro) e os que não votam por não acreditarem nos políticos.
A estes últimos importa dizer que votar permite muitas coisas. Quem vota tem muitas formas de manifestar o que pensa e que vão além da escolha de um partido. Pode votar branco e ao votar branco está a dar um sinal que deve ser interpretado como afeição à democracia, mas ao mesmo tempo indicação de não se rever em qualquer das opções de voto que lhe são oferecidas. O voto branco tem, pois, um significado de aviso aos partidos.
Pode também votar conscientemente nulo e ao votar nulo vota forte, pois quer dizer que algo está mal na democracia, pois nem sequer o voto branco lhe confia. Não pode esquecer-se a este propósito que, ao votar nulo, o eleitor pode não só fazer uma grande cruz, atravessando todos os partidos, como pode escrever o que vai no pensamento em palavras ou desenhos curtos. Perguntar-se-á para que serve isso, se não é, depois, publicitado? Publicitado não é, nos termos normais, mas podem ter a certeza que largos milhares de votos nulos por todo o país, contendo “escritos”, seriam objeto de atenção e de debate.
Não se pense que estou a incitar ao voto nulo ou ao voto branco. O que estou a afirmar é que é melhor e mais forte um voto nulo ou um voto branco do que uma abstenção.
Votar finalmente é uma escolha. Uma escolha que normalmente não é a escolha ideal. Não há uma identificação total do eleitor com o partido que escolhe, nem com os candidatos. Quem vota num partido apenas escolhe o que lhe parece melhor ou o que lhe parece menos mau e com isso contribui para o governo do país. Não deixa que outros decidam por ele. Pena é que o eleitor não tenha mais liberdade no ato de votar. Noutros países é possível mudar, por exemplo, a ordem dos candidatos; é possível riscar o nome de alguns deles dentro da lista, sem que o voto deixe de valer. Permite-se também que se vote em pessoas e não apenas em partidos. Precisamos de ser mais livres ao votar e para isso é preciso modificar urgentemente o nosso sistema eleitoral. 

António Cândido de Oliveira, in Diário do Minho