quinta-feira, 27 de julho de 2017

Reforma do Poder Local há 150 anos (1867): menos distrito, menos concelhos, menos freguesias


Em 26 de junho de 1867, foi publicada, no diário oficial, uma lei de administração civil aprovada nas Cortes que reformava profundamente a nossa administração local autónoma, dividindo o país em distritos, os distritos em concelho e os concelhos em paróquias civis. Os concelhos de Lisboa e Porto eram divididos em bairros e estes em paróquias civis. Ficou conhecida como o “Código Administrativo” de Martens Ferrão. 

Os distritos administrativos, por esta lei,  eram, no continente, o Algarve, com  capital em Faro; o Alto Alentejo com capital em Évora; o Baixo Alentejo (Beja); a Estremadura (Lisboa); a Beira Alta (Viseu); a Beira Baixa (Castelo Branco); a Beira Central (Coimbra); o Douro (Porto); o Minho (Braga); Trás-os-Montes Superior (Bragança); e Trás-os-Montes Inferior (Vila Real). Nas ilhas adjacentes, a Madeira, tendo como capital o Funchal; os Açores Meridionais (Ponta Delgada); os Açores Orientais (Angra do Heroísmo); e os  Açores Ocidentais (Horta). 

O governo ficava autorizado por esta lei a executá-la, procedendo à divisão dos distritos, dos concelhos e das paróquias civis. Cada concelho teria pelo menos 3.000 fogos ( o  “fogo” tinha, em média, 4 habitantes) . Cada paróquia civil teria, por sua vez, pelo menos 1.000 fogos nas zonas urbanas e 500 fogos nas povoações rurais. Para essa divisão, a lei indicava os elementos a ter em conta desde as divisões naturais dos solos produzidas pelos rios e montanhas bem como a comodidade das populações. 

Em 10 de dezembro de 1867, de acordo com a prevista execução da lei foi publicado um decreto com a divisão administrativa que previa apenas 13 distritos administrativos no continente: Minho, Douro, Trás-os-Montes Inferior, Trás-os-Montes Superior, Beira Alta, Beira Baixa, Beira Central, Guarda, Portalegre, Estremadura, Alto Alentejo, Baixo Alentejo e Algarve.   

Nos termos deste decreto, passados 3 anos, o distrito de Portalegre passaria a integrar o distrito do Alto Alentejo e o distrito da Guarda integraria  o distrito da Beira Alta, ficando assim o continente com apenas  11 distritos e os arquipélagos com 4 (3 nos Açores e 1 na Madeira). 

Por sua vez, e aqui haveria também uma profunda reforma, os concelhos seriam reduzidos para 178, dos quais 19 se localizavam nos Açores e na Madeira (atualmente são 308).  

Também profundíssima era  a reforma das freguesias, que passariam a ser denominadas “paróquias civis”, no total de 1.093 e das quais 67 ficavam nos Arquipélagos (atualmente temos 3.091 freguesias). 

As “paróquias civis” – o novo nome das freguesias – resultariam da agregação de paróquias eclesiásticas. A  paróquia civil de Priscos, por exemplo, do município de Braga  integraria as paróquias religiosas de Arentim, Cunha, Guizande, Oliveira, Priscos, Ruílhe, Tadim e Fradelos e ainda Tebosa.  

Mais detalhes e destino desta reforma merecerão a devida atenção.


(Artigo de opinião publicado no Jornal de Notícias de 27-07-2017 - versão revista e ampliada)

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Freguesias em Portugal e Inglaterra

As freguesias ou paróquias são uma instituição religiosa bem conhecida em Portugal, Espanha, França e Inglaterra.

No entanto, apenas em Portugal e na Inglaterra (civil parish) esta instituição assume um papel de relevo, nos dias de hoje, na organização político-administrativa, não sendo conhecida como tal na Espanha nem na França. O que se passou?

A resposta é aparentemente simples, embora deva ser devidamente estudada. Portugal e a Inglaterra fizeram profundas reformas administrativas que deram espaço às freguesias. Em Portugal temos 3091 freguesias e na Inglaterra cerca de 10.200.

Portugal no século XIX reduziu para pouco mais de 300 o número dos seus municípios (reforma de Passos Manuel), deixando lugar para a formação de freguesias próximas das populações e o mesmo sucedeu na Inglaterra, que já na segunda metade do século XX (1972), adotou uma organização administrativa de dois níveis territoriais, ambos com larga dimensão. A Inglaterra dividiu, em regra, o seu território em “counties” e “districts”(pouco mais de duas centenas) que poderemos  traduzir,  com grande liberdade,  por províncias e municípios, sendo ambos dotados de órgãos eleitos.

A Espanha, e principalmente a França, seguiram caminhos diferentes e fizeram de grande parte das suas paróquias municípios. “Chaque paroisse, chaque commune” (cada paróquia, cada município), gritou Mirabeau na Assembleia Nacional Francesa em 1789 quando estava para ser aprovado um projeto de lei que previa menos de mil municípios para toda a França. E assim se formaram à volta de 40.000 municípios que ainda hoje perduram e são fonte de problemas. Cerca de 90% dos municípios franceses têm menos de 2.000 habitantes e mais de 50% menos de 500 habitantes.

A Espanha não foi tão radical e ficou por cerca de 8.000 municípios desde a primeira metade do século XIX, mas muitos desses municípios são, em termos de população e território, freguesias, bastando lembrar que a vizinha Galiza tem mais municípios (314) do que Portugal inteiro que tem 308, dos quais 278 no continente europeu e 30 nos Açores e Madeira.

E não se diga, como por vezes se ouve dizer que as “communes” francesas não são municípios, pois uma parte destes, nas zonas urbanas têm 50.000 e mais habitantes, chegando alguns a ter centenas de milhar e a designação dos seus órgãos, por sua vez, não engana, pois a assembleia deliberativa de todos os municípios tem o nome de “conseil municipal”.

Não é de admirar, assim, que a Espanha e a França tenham um problema de organização municipal por resolver, pois estes minúsculos municípios estão longe de ter a força que têm os municípios portugueses ou os “districts” ingleses. E também não é de admirar que as freguesias não tenham espaço nestes dois países tão próximos de nós.

Sobre esta matéria é com a Inglaterra que devemos dialogar e aprender mutuamente.

(Artigo de opinião publicado no Jornal de Notícias de 21-07-2017)