Dois
jornais de Vila Nova de Famalicão, na
sua edição impressa de 26 de julho de 2023, publicaram, com largo destaque de primeira
página, o anúncio feito pelo Presidente
da Câmara e pelo Vereador da Cultura, em conferência de imprensa realizada no
dia 24, da vinda à Feira do Artesanato e da Gastronomia (38ª) dos
afamados artistas Paulo Gonzo, Áurea e Zé Amaro. Trata-se de um gasto de mais de 112.000 euros
para enriquecer a Feira.
O que os
jornais não disseram, nem podiam dizer nessa data, é que só no dia 27 de julho em reunião de
câmara este gasto foi submetido a
reunião de câmara e aprovado. Ou seja, a deliberação da câmara e a opinião dos
vereadores, nomeadamente os da oposição, foi apenas uma formalidade. Bem
poderiam estes na reunião de câmara exprimir opinião diferente, esgrimir
argumentos, pois a “deliberação” já estava tomada e anunciada.
Isto é uma
desconsideração das regras democráticas de tal ordem que deveria motivar vivos protestos dos
membros do órgão colegial câmara e
particularmente dos da oposição nessa reunião
e um claro voto contra. Um voto contra, independentemente
do conteúdo da deliberação, pelo procedimento seguido, pois não se tratam assim
os vereadores. Outra solução seria sair da reunião na ocasião
da votação.
Mas, vejamos
também o conteúdo. Gastar mais de 112.000 euros
com estes artistas é desviar dinheiro que deveria ser utilizado para
valorizar o artesanato e a gastronomia locais para fins
que não são os próprios de uma feira deste tipo.
Muito há a
fazer em favor do artesanato e da gastronomia famalicenses. Não está feita uma
história do estado do nosso artesanato e
gastronomia e todos sabemos que ela é rica, mas corre riscos, em muitos
domínios. Não se tem cuidado do apoio a actividades em vias de extinção ou a
sofrer sérios problemas como, por exemplo, a produção de mel. Não se tem
recuperado e valorizado a doçaria e bem nos lembramos, também a título de
exemplo, da qualidade dos doces brancos e
amarelos, dos “charutos”e das
“paciências”. E as broas de milho que se faziam (ainda fazem?) nas casas de
lavoura e não só? E os moinhos e os moleiros ? Com muito menos de 100.000 euros
tanta coisa se poderia fazer.
Em vez disso,
a câmara entendeu aprovar por unanimidade(!) dos seus 11 vereadores um
orçamento de 370.000 euros para a 38ª Feira organizada pelo município, mais
100.000 do que no ano passado.
Isto revela
bem a visão política que subjaz
a esta e certamente a outras feiras do artesanato e da gastronomia que
percorrem o país. Não se trata de apoiar fortemente o artesanato e a
gastronomia locais, dando a devida importância ao que de melhor há nos concelhos
em causa, quer no que é tradição, quer no que é novo, não! O que
interessa é que a Feira seja falada e badalada e se diga que vieram largas centenas de milhar de visitantes, muitos deles
contados várias vezes. É o espectáculo e com ele a publicidade (pré-eleitoral)
que está primeiro.
(Publicado no Diário do Minho de 11.8.2023 - texto revisto)