Se a
Constituição da República Portuguesa fosse respeitada, qualquer presidente de
câmara municipal ou da junta de freguesia, eleito no dia 26 de setembro de
2021, poderia ser destituído – e, juntamente com ele, todo o respectivo órgão
colegial - obrigando à consequente realização de eleições intercalares.
Fixemo-nos nas
câmaras municipais, somente por comodidade de exposição, porque o mesmo se
aplica às juntas de freguesia.
Estabelece a
Constituição, desde a revisão de 1997, no seu artigo 239.º n.º 3, que uma lei da
Assembleia da República deve regular, além de outros assuntos, os requisitos da
destituição dos órgãos executivos colegiais das autarquias locais, ou seja, nos
municípios, das câmaras municipais. Aguarda-se, há quase 25 anos, a publicação
dessa lei.
Esta
destituição é a natural consequência da actuação do princípio da responsabilidade dos órgãos
executivos perante os órgãos deliberativos, consagrada em sede de princípios
gerais do poder local no artigo 239.º da Constituição.
Essa
responsabilidade já existe, mas não como a Constituição estabelece. Atualmente,
nos termos da lei vigente, a assembleia municipal pode aprovar uma moção de
censura. Porém, no entendimento
predominante da doutrina, ela não determina a queda da câmara, constituindo
apenas uma censura política, sem outras consequências.
Esta clara
violação da Constituição já não espanta,
habituados, que estamos, a ignorar a lei
fundamental neste capítulo.
E que sucederia
se a Constituição fosse cumprida e uma moção de censura fosse aprovada e
destituísse o órgão executivo colegial e,
com ele, o presidente da câmara?
A lei poderia
seguir fundamentalmente dois caminhos.
Um deles seria
a mera queda da câmara municipal e a eleição intercalar de uma, nova, pelos
cidadãos. O outro – melhor, no nosso entendimento - seria o de, uma vez aprovada
uma moção de censura, “caírem” a câmara e a assembleia na parte composta pelos membros diretamente
eleitos, realizando-se eleições intercalares para os dois órgãos municipais. É este, em
termos gerais, o modelo seguido em Itália. Este último caminho teria a vantagem
de obrigar a assembleia a exercer, com ponderação, o seu poder de destituição
do executivo e devolveria aos cidadãos o poder para solucionar a crise
existente.
Não tem
sentido manter a situação actual por ser
propícia a prejudicar o bom governo municipal. Considerar que um presidente da
câmara deve manter-se no poder por quatro anos, apenas por ter figurado em
primeiro lugar na lista mais votada não é aceitável. E viola a Constituição.