A Constituição deve ser um documento de consenso nacional.
Desde o referendo de 1997, todos sabemos que não há, no nosso país, consenso sobre a regionalização do continente (prevista nos artigos 236º, nº. 1, 255º a 262º). Trata-se de um tema que nos divide e, por isso, deverá ser retirado da Constituição. A sua manutenção faz perigar o respeito devido pela Lei Fundamental. Há quase 50 anos que está por cumprir nesta parte.
Assim sendo, porque não se retiram aqueles preceitos da Constituição, aproveitando a revisão constitucional em curso?
A nosso ver, tal sucede por uma inesperada aliança de dois grupos de cidadãos cuja opinião tem suporte nos partidos dos quais depende a revisão da Constituição (PS e PSD). O grupo dos adversários da criação de regiões sabe que a actual redacção da Constituição, principalmente desde 1997, com as dificuldades impostas ao processo, é a melhor forma de ela não se fazer. O grupo dos defensores da regionalização do continente, por sua vez, acredita, ingenuamente, que o facto de estar consagrada constitucionalmente facilita a criação de regiões.
Acaba, pois, por ser minoritária a posição daqueles que defendem que a regionalização deve ser retirada da Constituição, sem a proibir, tornando-a facultativa. Apesar de minoritária, essa posição é a mais constitucional e a mais democrática. Mais constitucional, porque retira da Constituição um tema que divide os portugueses. Mais democrática porque, ao retirar da lei fundamental tais preceitos, remetendo para a lei ordinária a criação de regiões administrativas, coloca adeptos e adversários em pé de igualdade.
Os adeptos tentarão aprovar no parlamento a criação de regiões administrativas. Os adversários lutarão contra tal aprovação. A realização de um referendo sobre a regionalização pode sempre ser proposta e acontecer. É a luta política normal num país democrático.
Mais: se forem criadas regiões, mais tarde, poderão ser extintas, pois não serão constitucionalmente obrigatórias.
Não há que ter medo da criação de autarquias regionais.
Se forem aprovadas e resultarem, mantêm-se, se não resultarem, extinguem-se!
(Artigo de opinião publicado no Jornal de Notícias, de 15-12-2022)