quinta-feira, 1 de fevereiro de 2024

Assembleias Municipais: o seu papel e as senhas de presença

As assembleias municipais são o órgão máximo do município. Dito isto, muito dos leitores não acreditam e com boas razões, dizendo que órgão máximo do município é o presidente da câmara e que  só não vê isso, quem não quer.

Respondo, dizendo que têm razão, que na prática o órgão máximo do município é o presidente da câmara, mas acrescento que assim é porque a assembleia tal permite. O presidente da câmara e com ele a câmara nada de importante poderão fazer e mandar se a assembleia não aprovar o orçamento, se não autorizar a realização de empréstimos vultuosos, contratos de certo montante , vendas de património e tantas outras coisas  que, no geral, são  as mais importantes do município.

E isto é assim porque num Estado de Direito o presidente da câmara, que é  o chefe do poder executivo, não faz, nem pode fazer,  o que bem entende, tendo de obter o apoio do parlamento local que é a assembleia municipal.

Bem me podem dizer que isso é apenas uma formalidade tal como quem vai ao notário para obter um título necessário para  formalizar um contrato de compra e venda que já está feito e que o notário apenas regista,  entregando  o documento respectivo,  não podendo alterar o conteúdo do contrato,  desde que não viole a lei.

É verdade que a assembleia municipal se comporta por vezes e em muitos municípios quase como um notário, fazendo a vontade do presidente, mas não tem de agir assim, não tem de ser um mero notário.

Uma assembleia que se dê ao respeito analisa cuidadosamente , por exemplo, uma proposta apresentada pela câmara de contrato de empréstimo ou de aquisição de um prédio,   vê se está bem feita e se é a que  melhor serve  o município e assim sendo, aprova-a; mas também a pode rejeitar por considerar, por exemplo, que a proposta não é oportuna ou não é a mais conveniente para o município.  Este poder ninguém o pode tirar à assembleia.

Repare-se que não estou aqui a dizer que a assembleia deve estar contra a câmara e rejeitar sempre as propostas que esta apresente. De nenhum modo. O que estou a dizer é  que o poder está repartido entre a câmara e a assembleia e que os dois órgãos devem respeitar-se mutuamente. Mais acrescento  que, para o bom governo do município,  os dois órgãos devem estar,  em regra,  de acordo. Em regra, mas não necessariamente sempre.

Uma assembleia que se preze constituída por membros qualificados com opiniões diferentes, resultantes dos grupos municipais que a compõem,  pode e deve ajudar a câmara a governar melhor, elaborando boas propostas e  estando atenta às críticas que, porventura, lhe sejam feitas. Uma assembleia municipal bem constituída é elemento importante para o bom governo do município.

É neste contexto que deve ser vista a recente alteração à lei do estatuto dos eleitos locais que veio alargar o direito dos membros da assembleia a senhas de presença. Os membros da assembleia municipal não exercem como sabemos as suas funções a tempo inteiro ou meio tempo. Não recebem um vencimento mensal. Recebem apenas senhas de presença que variam entre 60 e 80 euros por cada sessão da assembleia em que participem.

Estas senhas de presença são merecidas porque os membros da assembleia (deputados) devem estudar os assuntos que vão ser debatidos nas reuniões, devem estar atentos aos debates das propostas e votar no momento próprio. Isso implica tempo tirado a outras actividades e a senha  é uma compensação por esse esforço e podemos dizer mesmo que tem um montante modesto.

Até agora essa senha só  era devida, num certo entendimento, errado a meu ver, mas entendimento dominante com base numa interpretação  restritiva da lei vigente,  por cada sessão ordinária ou extraordinária da assembleia por muito extensa que ela fosse e mesmo que houvesse necessidade de a desdobrar em várias reuniões e o mesmo se diga da participação dos membros nas reuniões das comissões existentes na organização da assembleia.

Porém a partir deste ano e por um enxerto feito no Orçamento do Estado para 2024 o artigo 10.º, nº 1,  da Lei n.º 29/87, de 30 de Junho (Estatuto dos Eleitos Locais) passou a ter a seguinte redacção que alarga o direito a senhas de presença:

 

 “Os eleitos locais que não se encontrem em regime de permanência ou de meio tempo têm direito a uma senha de presença por cada reunião das sessões ordinárias ou extraordinárias do respetivo órgão e das comissões a que compareçam e participem”.

        É uma alteração  de aplaudir e que se aplica também com as devidas adaptações ao parlamento das freguesias.

(Publicado no DM em 1.2.24)