No dia 18 de
abril de 2018, foi assinado, no âmbito de um acordo entre o PSD e o PS,
um documento denominado “Declaração conjunta sobre a descentralização”.
O documento abre significativamente com estas palavras “Portugal é
identificado como um dos países da União Europeia com perfil mais
centralizado e centralizador. Isso compromete o processo de
desenvolvimento e equilibrado dos vários territórios, cristaliza
desigualdades, distancia-o dos mais progressivos e mais socialmente
justos (países) da U.E.”.
O reconhecimento desta realidade, que aliás é partilhada pelos restantes partidos, bem justifica a celebração deste acordo.
Descentralização significa distribuição vertical do poder e anda profundamente ligada ao princípio da subsidiariedade.
Descentralização significa que os assuntos do nosso país de natureza
local, regional e nacional não devem ser resolvidos só pelo Governo. A
este cabe resolver apenas os problemas – e muitos são – de âmbito
nacional O princípio da subsidiariedade diz-nos que tudo o que pode ser
bem feito ao nível da freguesia, por esta deve ser feito, através dos
respetivos órgãos. Por sua vez, o que pode ser bem feito ao nível do
município por este deve ser feito e não por outra entidade local.
Finalmente, o que bem pode ser feito a nível regional por uma entidade
regional livremente eleita deve ser realizado. Como se sabe, não temos
ainda esta democracia regional prevista na Constituição e aplicada nos
Açores e na Madeira, aliás, com um estatuto mais profundo do que o
previsto para o continente e que bem se justifica, dada a insularidade
daqueles territórios.
A declaração tem duas partes: uma intitulada “Transferência de
competências para as autarquias locais” e outra denominada “Reforma da
organização subnacional do Estado”.
A primeira está muito marcada pelo aspeto financeiro e prevê mesmo a
revisão da Lei das Finanças Locais. Nota-se uma preocupação com a
aplicação desta lei, de maneira a que esta seja efetiva e não, como se
tem verificado até agora, que apenas se transfira do Orçamento do Estado
apenas uma parte do que a lei prevê. O acordo esclarece que a Lei das
Finanças Locais deve ter plena aplicação em 2021.
No que toca à Reforma da organização subnacional do Estado, prevê-se
a realização “de estudos aprofundados a executar por Universidades até
ao final de julho de 2019”. Deve ter-se em conta, nesse estudo, a
determinação dos níveis de descentralização a partir da análise
comparativa de modelos em países da União Europeia e da OCDE, a
delimitação das competências próprias dos níveis subnacionais, avaliando
os recursos e os meios próprios a transferir.
Este documento foi subscrito, por parte do PSD, pelo deputado Álvaro
Amaro e, pelo lado do PS pelo membro do Governo, o Ministro da
Administração Interna Eduardo Cabrita.
Portugal só terá a ganhar com a boa e pronta execução deste importante acordo.
(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 27-04-2018)
sexta-feira, 27 de abril de 2018
terça-feira, 17 de abril de 2018
A democracia que falta
Não há melhor exemplo de centralização do que a resolução de assuntos de âmbito regional pelo Governo da República
Nós, portugueses, temos o direito de resolver os problemas regionais do nosso país através de representantes eleitos ou diretamente através de referendo. Este direito está consagrado na Constituição, mas, mesmo que não estivesse, existiria na mesma, pois faz parte dos princípios democráticos do Estado de direito.
A democracia, que tem na base a igualdade de todos os cidadãos e o respeito pelos direitos fundamentais de cada um deles, exige que os órgãos de poder político-administrativo estabelecidos a nível territorial emanem da vontade popular.
Isto acontece em Portugal atualmente a nível local, através da eleição dos órgãos das freguesias e dos municípios pelos respectivos residentes, a nível nacional através da eleição da Assembleia da República da qual emana o Governo da República e a nível regional através da eleição dos órgãos das regiões autónomas dos Açores e da Madeira. Apenas os portugueses do continente não gozam do direito democrático de eleger órgãos regionais.
Os problemas regionais do nosso país existem e ninguém os pode ignorar. O que não existe é a democracia a nível regional. Os problemas regionais têm sido resolvidos, no continente, pelo Governo, violando claramente os princípios da descentralização e da subsidariedade. Não há melhor exemplo de centralização do que a resolução de assuntos de âmbito regional pelo Governo da República.
Trata-se claramente da subtração de um direito que tem sido consentida pelos portugueses do continente. Não se diga que a culpa é do Governo que não regionaliza. A responsabilidade é dos portugueses que julgam que a democracia é dada e não conquistada. Não temos no nosso país, por muito que nos custe, uma consciência democrática regional suficientemente forte e unida para estabelecer a democracia a nível regional.
A nosso ver, se queremos completar a democracia no nosso país, estabelecendo o elo que lhe falta, precisamos de lutar por ela. O modo para tal combate democrático é bem simples: não permitir que este tema seja ignorado, lutando por uma democracia completa em todo o território nacional.
E a forma de não ser ignorado é colocá-lo na ordem do dia. A criação de movimentos transversais de defensores da democracia regional será um passo importante. Movimentos que incluam cidadãos de todos os partidos e cidadãos independentes. A realização de debates como o que se realizou recentemente em Vila Real (10/3/18) é um bom exemplo. A publicação de artigos, estudos e livros sobre a matéria é outro meio. O silêncio é que não!
(Artigo publicado no Jornal PÚBLICO de 16-04-2018)
Nós, portugueses, temos o direito de resolver os problemas regionais do nosso país através de representantes eleitos ou diretamente através de referendo. Este direito está consagrado na Constituição, mas, mesmo que não estivesse, existiria na mesma, pois faz parte dos princípios democráticos do Estado de direito.
A democracia, que tem na base a igualdade de todos os cidadãos e o respeito pelos direitos fundamentais de cada um deles, exige que os órgãos de poder político-administrativo estabelecidos a nível territorial emanem da vontade popular.
Isto acontece em Portugal atualmente a nível local, através da eleição dos órgãos das freguesias e dos municípios pelos respectivos residentes, a nível nacional através da eleição da Assembleia da República da qual emana o Governo da República e a nível regional através da eleição dos órgãos das regiões autónomas dos Açores e da Madeira. Apenas os portugueses do continente não gozam do direito democrático de eleger órgãos regionais.
Os problemas regionais do nosso país existem e ninguém os pode ignorar. O que não existe é a democracia a nível regional. Os problemas regionais têm sido resolvidos, no continente, pelo Governo, violando claramente os princípios da descentralização e da subsidariedade. Não há melhor exemplo de centralização do que a resolução de assuntos de âmbito regional pelo Governo da República.
Trata-se claramente da subtração de um direito que tem sido consentida pelos portugueses do continente. Não se diga que a culpa é do Governo que não regionaliza. A responsabilidade é dos portugueses que julgam que a democracia é dada e não conquistada. Não temos no nosso país, por muito que nos custe, uma consciência democrática regional suficientemente forte e unida para estabelecer a democracia a nível regional.
A nosso ver, se queremos completar a democracia no nosso país, estabelecendo o elo que lhe falta, precisamos de lutar por ela. O modo para tal combate democrático é bem simples: não permitir que este tema seja ignorado, lutando por uma democracia completa em todo o território nacional.
E a forma de não ser ignorado é colocá-lo na ordem do dia. A criação de movimentos transversais de defensores da democracia regional será um passo importante. Movimentos que incluam cidadãos de todos os partidos e cidadãos independentes. A realização de debates como o que se realizou recentemente em Vila Real (10/3/18) é um bom exemplo. A publicação de artigos, estudos e livros sobre a matéria é outro meio. O silêncio é que não!
(Artigo publicado no Jornal PÚBLICO de 16-04-2018)
quinta-feira, 12 de abril de 2018
O exemplo de Barcelos
Em Portugal, o sistema eleitoral a nível
local possibilita a existência de maiorias relativas, dada a aplicação do
método proporcional d’Hondt.
Após as eleições de 1 de outubro de 2017, em
algumas dezenas de municípios, a lista do presidente da câmara municipal não
obteve a maioria absoluta dos vereadores, o que significa que o presidente eleito
não tem condições para governar o município se não tiver apoio claro de um ou
mais vereadores de outras listas.
Na grande maioria dos municípios portugueses
nessa situação, o problema foi ultrapassado através de entendimentos da lista
do presidente com vereadores de outras listas. Foi o que sucedeu, por exemplo, com Lisboa e o
mesmo acaba de suceder em Barcelos.
Esta situação de maioria relativa costuma
ocorrer, também, nas assembleias municipais e, em regra, nos mesmos municípios,
mas aí o acordo costuma obter-se mais facilmente, pois os presidentes de junta
de freguesia, membros por inerência, não gostam destes impasses, que
prejudicam, normalmente, a respetiva freguesia.
Nos poucos casos contados em que não se chega
a acordo, a solução passa pela realização de novas eleições, através de um
procedimento complexo, e de um curto período em que o município está sujeito a
uma comissão administrativa, nomeada pelo governo.
Em 2013, uma situação de impasse no município
de S. João da Madeira foi resolvida através de eleições antecipadas e o
resultado foi uma larga maioria absoluta para a lista do presidente. A prática
tem demonstrado que os cidadãos preferem que haja acordos e gostam que quem foi
eleito presidente tenha condições para governar.
Como já tivemos oportunidade de referir, a
lei eleitoral precisa de ser modificada, de modo a permitir ao órgão executivo
(câmara municipal) a possibilidade de, após eleições, poder exercer em pleno as
funções executivas.
O alcance de acordos é positivo, mas quando
tal não for possível, a realização de eleições antecipadas deve ser facilitada,
o que não acontece no momento atual, pois a lei não prevê solução expressa para
estas situações de impasse.
(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 12-04-2018)
quinta-feira, 5 de abril de 2018
O sistema de governo municipal: incongruência
O sistema de governo municipal português tem
uma grave incongruência que importa corrigir. Diz a Constituição - e diz a lei
- que é presidente da câmara municipal o
primeiro candidato da lista mais votada para a câmara municipal.
Ao dizer isto, a lei, para ser congruente,
deveria garantir ao presidente eleito condições para governar o município
juntamente com a sua equipa de vereadores, mas não garante.
Uma vez que vigora, no nosso país, um sistema
eleitoral proporcional (método d’Hondt), pode acontecer – e acontece – que, por
vezes, o presidente da câmara está em minoria dentro do órgão colegial.
Veja-se este exemplo: numa câmara de nove
membros, a lista do presidente tem quatro vereadores, uma lista da oposição
obteve outros quatro, e ainda uma outra lista obteve um vereador.
Quando assim sucede, basta o vereador da
lista que obteve menos votos entender-se com a lista que obteve quatro vereadores, mas que
não foi a mais votada, para manietar o presidente.
Numa situação destas, o presidente preside,
mas não governa e a oposição não preside, nem governa. Está criado um impasse.
Como se poderá ultrapassar isto?
Teoricamente, há duas formas: uma, as oposições unem-se e elegem um outro presidente
(é o que é permitido em Espanha); outra, fazem-se novas eleições. A primeira
solução não é possível, pois a Constituição não a permite. A segunda solução
não está prevista na lei.
Neste quadro, a solução legalmente possível,
no nosso país, é muito original: provocam-se eleições para a câmara municipal,
renunciando o presidente da câmara e todos – sublinhe-se, todos – os membros
efetivos e suplentes da lista do presidente. Assim, não havendo presidente da
câmara, nem quem o substitua na lista, há que fazer eleições para eleger, de
novo, a câmara municipal e o seu presidente.
Entretanto, até à realização de novas
eleições, a realizar em período curto, funciona uma comissão administrativa
nomeada pelo governo, de acordo com os resultados das últimas eleições.
É bom de ver que esta é uma solução de
recurso e que a lei tem de ser corrigida, de forma a não provocar estes
impasses.
Vejamos duas possibilidades: uma, será dar à
lista mais votada o número de vereadores necessários para formar maioria; outra,
será adotar o sistema espanhol e permitir que as oposições se unam para apoiar
maioritariamente um novo presidente.
De qualquer modo,
será necessário modificar a Constituição. A Constituição e a lei não devem
provocar impasses, mas antes evitá-los.
(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho de 05-04-2018)
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