Está por fazer a história das paróquias religiosas e das freguesias civis ao longo do século XIX e da primeira metade do século XX, com prejuízo para o bom entendimento do que deve entender-se por uma freguesia hoje.
Importa dizer a este propósito que as freguesias que chegaram aos nossos dias tiveram origem nas paróquias religiosas e quase se pode falar de um acompanhamento estreito entre umas e outras. Esse acompanhamento resultou do facto de por ocasião da implantação do liberalismo em 1820 existirem cerca de 4.000 paróquias religiosas que passado um período muito conturbado de cerca de 15 anos foram integradas na organização administrativa portuguesa pelo Código Administrativo de Passos Manuel de 1836 com o nome de freguesias (artigo 1.º).
Na verdade, as freguesias não foram inventadas pelo Código Administrativo de 1836. Este aproveitou as paróquias religiosas que tinham também o nome de freguesias e seguindo uma lei de 1830 considerou que era bom que houvesse em cada uma das paróquias uma junta de natureza civil da confiança da respectiva população e assim por esta eleita.
É verdade que este Código previa no seu artigo 3.º que o número de freguesias e a sua extensão seria “oportunamente e convenientemente regulado em relação à comodidade dos povos”, mas apenas houve uma tentativa feita por uma lei de 1867 de reduzir, no continente, o número de freguesias para 1026, com o nome de paróquias civis, permanecendo na órbita religiosa 3801 paróquias eclesiásticas. Esta reforma, que reduzia também o número de municípios para 159 (eram 263 no continente) não foi avante por virtude da Revolta da Janeirinha.
Falhada esta reforma o que de mais relevante aconteceu para as freguesias foi a sua afirmação como elemento da nossa organização administrativa através do Código Administrativo de 1878 subscrito pelo minhoto Rodrigues Sampaio que não alterou significativamente o número de concelhos e paróquias , assim se mantendo uns e outros até à reforma de 2013, atravessando mesmo a passagem da Monarquia para a República, apesar da separação entre o Estado e a Igreja..
O que a República fez, em 1913, data da primeira lei que publicou sobre a organização da administração local foi, mantendo os concelhos e as paróquias, acrescentar apenas o adjectivo “civil” às paróquias, mantendo curiosamente o nome de “junta de paróquia” para o respectivo órgão, como era tradição. E só em 1916, por nova lei aboliu, o nome de “paróquia civil”, passando a adoptar o nome de freguesia, e passando a denominar “junta de freguesia” a “junta de paróquia”. Mudança de nomes, não de substância, pois, neste domínio.
O modelo nosso de freguesia tem sido sempre o da paróquia religiosa, nem muito grande, nem muito pequena, cumprindo tarefas sem grande complexidade técnica e muito próxima das populações.
A única reforma significativa das freguesias foi a de 2013 (Miguel Relvas), diminuindo o número de freguesias do continente de 4.050 para 2.882. Será que esta reforma de 2013 quis fazer uma reforma profunda das freguesias, deixando de ter como modelo as freguesias religiosas? A nosso ver, não. O que a reforma de 2013 pretendeu foi tornar mais fortes as freguesias, extinguindo as que não eram viáveis, mas de nenhum modo fazer das freguesias pequenos municípios quer pela extensão territorial, quer pela população, quer pelas competências. Por isso, tem sentido corrigir hoje os erros dessa reforma feita de modo muito apressado.
(Artigo de opinião publicado no Diário do Minho, de 04-11-2022)