As freguesias, como entes de proximidade, os únicos entes territoriais de que se pode falar de vizinhança, fazem falta para uma boa administração, a nível local, do nosso país. Elas não devem ter uma dimensão tão grande que se possam confundir com municípios, nem tão pequena que as impeça de exercer devidamente as tarefas que lhes cabem.
Em 2013, através da Lei n.º 11-A/2013, de 28 de janeiro, cometeu-se um erro manifesto para reformar territorialmente as nossas freguesias. Aceitou-se que o número delas era excessivo e para corrigir o excesso optou-se por reduzir obrigatoriamente o número de freguesias em todos os municípios do país de acordo com um critério percentual, importando pouco que o município tivesse 50 ou 5 freguesias. O critério era tão absurdo que o legislador teve de parar a sua aplicação obrigatória quando chegou aos concelhos com 4 freguesias ou menos. Ignorou-se, então, a realidade do país que tinha, antes da reforma de 2013, mais de 50% dos seus municípios com 10 freguesias ou menos e 80% com 20 ou menos. Ora, tendo em conta que os nossos municípios têm, em média, uma área de cerca de 300 Km2 (a mediana é de 217 Km) para quê reduzir, desde logo, o número de freguesias nesses concelhos, salvo aquelas demasiado pequenas?
O critério deveria ter sido outro e poderia reduzir-se, em regra, o número de freguesias onde a população respectiva fosse diminuta, havendo, então, mais de 800 com menos de 300 habitantes. Poderia argumentar-se que isso não satisfaria a “troika” que exigia uma “significativa” redução do número de freguesias e municípios, mas todos sabemos que para a “troika” as freguesias não eram um problema financeiro e facilmente teria sido convencida disso e da especial utilidade delas, nomeadamente no interior do país, nas negociações que decorreram durante a intervenção financeira. Aliás, o número de municípios não sofreu qualquer alteração.
Em 2021, o erro da Lei n.º 39/2021, de 24 de junho, que regula a criação de freguesias não está na definição do conceito de freguesia, pois os requisitos que nela se estabelecem para essa criação, que será, em regra, uma mera reposição de freguesias extintas em 2013, são, em geral, razoáveis. O erro está no procedimento de reposição. A lei prevê um procedimento geral de reposição e um procedimento “especial, simplificado e transitório” para casos que considera “erro manifesto e excepcional” (artigo 25.º) da reforma, mas que de simples e claro nada têm. É necessário estabelecer um procedimento único realmente simples e desburocratizado para aqueles casos em que a união foi, na verdade, um erro, ora porque se criaram megafreguesias, ora porque se extinguiram freguesias perfeitamente viáveis, desprezando a vontade destas.
A Lei n.º 39/2021 vai ser revista e cabe acompanhar essa revisão para termos uma lei que permita a formação de um mapa territorial das freguesias no continente e nas regiões autónomas de acordo com o que devem ser as freguesias, ou seja, autarquias locais inframunicipais próximas dos cidadãos.
(Artigo de opinião publicado no Expresso, de 21-10-2022)