quinta-feira, 4 de setembro de 2025

As assembleias municipais : parlamentos locais débeis

         O jornal Expresso na recente edição de 29 de Agosto de 2025 e no seu caderno principal dá largo relevo a um estudo efectuado pela Associação de Estudos de Direito Regional e Local (AEDREL),  instituição privada sem fins lucrativos e de utilidade pública, com sede em Braga,  sobre a organização e funcionamento das assembleias municipais do nosso país.

Foram inquiridas e responderam as 308 assembleias municipais do nosso país e o estudo está na fase final de conclusão para ser publicado e apresentado durante o presente mês de Setembro.

A jornalista Cláudia M. Almeida fez um bom trabalho e o jornal por critérios editoriais próprios, deu especial relevo aos problemas da paridade com uma baixa participação de mulheres na composição deste órgão (31,1% ) e da idade dos membros, indicando que o número de membros das assembleias municipais com idade inferior a 35 anos é inferior a 10%.

São dados importantes seguramente, mas também  importantes são outros dados que o estudo procura abordar e que merecem ser destacados, compreendendo-se que não houvesse espaço para o fazer na peça jornalística do Expresso.

As assembleias municipais são na sua essência parlamentos locais com a missão não só de aprovar as deliberações de maior relevo para o município, desde logo o orçamento, mas também de fiscalizar a acção da câmara municipal, podendo votar moções de censura à mesma.

Ora, para bem desempenhar estas duas importantes funções é fundamental que as assembleias tenham membros politicamente qualificados, independentemente do sexo e da idade.

A qualificação política não exige necessariamente títulos académicos ou outros. Ela manifesta-se no bom conhecimento dos assuntos do município respectivo, no debate dos mesmos e nas deliberações fundamentadas subsequentes.

Para que assim suceda os candidatos das diversas listas devem ter conhecimento desses assuntos ou vontade de os bem conhecer e devem provir sempre que possível de várias áreas do saber.

Por sua vez, os eleitos devem estar, em regra, integrados em grupos municipais, com instalações adequadas e próprias e dispondo de pessoal da sua confiança durante o tempo de  exercício do seu mandato. Tenha-se em conta que os membros das assembleias municipais não exercem funções a tempo inteiro e não dispõem, por isso, de tempo para obter a informação de que precisam para intervir nas reuniões. O pessoal de apoio, em número que depende da dimensão do município e de cada grupo municipal, ajuda a resolver esse problema.

As assembleias, por sua vez, não reunem apenas em plenário através de sessões ordinárias e extraordinárias. Podem e devem reunir em comissões permanentes sectoriais que devem ser constituídas no início do mandato para os domínios de maior responsabilidade do município como sejam, desde logo,  o urbanismo e as finanças. É função destas comissões apreciar os assuntos a submeter a plenário, estudando-os e fazendo relatório o que muito ajudará a enriquecer o debate em plenário.

Sem estes dois meios:  grupos municipais apoiados e comissões sectoriais a assembleia dificilmente poderá cumprir devidamente a sua missão, mesmo tendo membros qualificados.

As assembleias municipais devem, por outro lado, prestar contas da sua actividade fazendo um autocontrolo através de um  relatório  anual detalhado, inclusive do ponto de vista financeiro, que deverá ser publicado e apreciado numa reunião plenária da assembleia.

Dir-se-á que em Portugal não há lei que tal permita expressamente, como sucede na vizinha Espanha,  mas a verdade é que também não proíbe e antes dá abertura para essa permissão no artigo 31.º, n.º 3, parte final,  da Lei n.º 75/2013 e há uma assembleia onde tudo isto ocorre  que é a de Lisboa, sendo a lei das autarquias igual para todas as assembleias do país. 

Uma última nota para dizer que uma assembleia municipal que se preze não deixará de lutar isoladamente e em grupo para que as moções de censura à Câmara municipal, que apresentem e aprovem, tenham o efeito que a Constituição determina no seu artigo 239.º n.º 3, parte final, que é a destituição do órgão executivo. Há mais de 25 anos que se espera pela lei que regule essa destituição e a não aprovação dessa lei evidencia a debilidade do poder das assembleias municipais, apesar de muitas delas  terem deputados da Assembleia da República.

(DM-4-9-25)

quinta-feira, 21 de agosto de 2025

A Imprensa regional que faz falta

O artigo que segue é uma opinião, porventura polémica e, como opinião que é, está sujeito à crítica, o que se aceita desde já.

Louva-se muito a importância de imprensa regional e com razão, mas faz falta a crítica à imprensa regional. Desde logo, importa ter presente que a maior parte da denominada imprensa regional não o é. A grande maioria da imprensa “regional” do nosso país é meramente municipal.

Não há mal em haver imprensa municipal, principalmente nos grandes e médios concelhos. O mal está noutro lado. Muita desta imprensa municipal e muita da imprensa regional não tem jornalistas de investigação ou, pelo menos, jornalistas que tenham tempo para aprofundar as notícias que surgem e osfactos que não são notícia, por estarem escondidos.

À partida, seria a imprensa verdadeiramente regional que estaria em melhores condições para ter jornalistas dedicados a esse trabalho, mas muitas vezes não tem ou não tem em número suficiente para fazer o trabalho que lhes compete.

Nestas condições temos uma imprensa regional/local sem jornalistas ( ou sem tempo para fazer jornalismo fora das tarefas exigentes da preparação de cada edição) e o que sucede é triste. Abrimos, de um modo geral, esses jornais e o que neles vamos encontrar é mera informação/propaganda da ou das câmaras municipais (e as câmaras municipais estão cada vez mais apetrechadas e preocupadas em tomar conta do espaço dos jornais, colocando neles as “notícias” que lhes interessam) e encontramos também, frequentemente (mas nem em todos), comunicados ou posições da oposição/oposições, que valem o que valem, porque estas também só transmitem o que lhes interessa e muitas vezes estão longe de ser fiáveis.

Com jornais assim não vamos longe e quem perde são os leitores e os eleitores em tempo de eleições. Para não se dizer que estamos apenas a escrever generalidades, vamos descer ao concreto e dar exemplos de um município.

Esse município é Famalicão e espelha bem o que dissemos. Existem, na sede do concelho, três semanários e um mensário impressos (em Agosto estão de férias) e um jornal apenas digital. Todos têm uma característica comum: não têm jornalistas com tempo disponível para vir para a rua e dar aos leitores uma informação mais detalhada do que acontece de relevante no concelho.

Damos alguns de muitos exemplos. Aprovou-se durante o mandato que agora termina a instalação numa parte do concelho Outiz/Calendário/Vilarinho das Cambas de uma central fotovoltaica de produção de energia electrica, cobrindo uma área de cerca de 80 hectares e acolhendo mais de 100.000 (cem mil) painéis solares no meio do maior segredo. Foi apenas quando se começaram a derrubar árvores (sobreiros inclusive) na concretização da instalação que este assunto foi trazido para os jornais e debatido. Já era tarde. Um jornalismo atento não teria permitido este segredo e daria informação que ainda hoje não temos.

Outro exemplo. A Câmara aprovou e deu até grande relevo no seu boletim de propaganda (o denominado “boletim municipal”) e num bom vídeo na net - que vale a pena ver - a um projecto ambiental do maior interesse que ficou conhecido como a “Paisagem Protegida das Pateiras do Ave” na extensa freguesia de Fradelos. Ao que parece, interesses económicos bem fortes opuseram-se e tiveram êxito. O projecto foi abandonado durante o presente mandato e depois de várias peripécias instala-se naquele local um estranho Pavilhão Multiusos cuja história detalhada está por fazer. Os jornais locais não trataram devidamente este assunto.

Outros exemplos poderiam ser dados, tais como o “Ecoparque de Esmeriz”, a recentíssima ampliação de uma indústria de produtos químicos perigosos em Landim, a aprovação da instalação no centro da cidade de estabelecimentos do Lidl e do Continente ( prejudicando a habitação) e outros.

Também tinha o maior interesse que a imprensa local nos desse informação neste tempo eleitoral da grave crise que assola o PSD e também, em boa parte, o PS em Famalicão . Mas como é isso possível se não há jornalistas com tempo disponível?

Devemos concluir que a imprensa local/regional não faz falta? De nenhum modo. Faz falta, mesmo assim, até porque dá, desde logo, informação provinda de associações e instituições locais, mas não nos devemos contentar com o seu estado actual. Importa que tenha meios para bem exercer o seu papel. Tema para outro artigo e para questionar o sempre falado apoio do Estado à imprensa regional que tão preciso é.

(DM-21-8-25)

quinta-feira, 7 de agosto de 2025

Justiça: Erros que perduram

            Há cerca de um ano (19-9-2024) escrevíamos, aqui, nestas colunas do Diário do Minho que ia ser instalado em Vila do Conde um polo do Centro de Estudos Judiciários com a enorme vantagem de não terem de ir para Lisboa durante um ano candidatos/as a magistrados/as judiciais e do Ministério Público, arcando  com as repectivas despesas de alojamento, alimentação e outras.

A instalação do polo justificava-se perfeitamente, porque a maioria dos candidatos a magistrados é do Norte.  A instalação está feita e vai começar este ano em instalações provisórias.  Só que não abordámos nesse artigo um problema que é sério e que precisa de ser enfrentado.

 O prédio onde o polo vai ser instalado definitivamente, situado no centro histórico de Vila do Conde ( Convento do Carmo) não tem as condições necessárias para cumprir a sua função. É pequeno, dificilmente pode ser alargado e não tem espaço para estacionamento, por pouco que seja. Dir-se-á que isso depois resolve-se, mudando para outro lugar, se necessário.

É  tendo em conta a solução “isso, depois,  resolve-se “ que pretendo chamar a atenção para o que se está a passar em Braga, procurando demonstrar que a regra é a de  que o “erro perdura”.

Em 2004, no âmbito de uma grande reforma da administração da justiça administrativa e fiscal foi instalado em Braga o Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF), tendo sido as antigas instalações da Casa dos Magistrados da Comarca de Braga situada num prédio da rua de Damão, que serviram de lugar para o efeito.

Como é óbvio o local escolhido foi mau. Certamente pensou-se: é importante instalar agora o TAF e depois o problema do melhor local resolve-se.

Passaram mais de vinte anos e o problema não se resolveu. O TAF, que cresceu muitíssimo em processos (e, consequentemente em juízes e em magistrados do Ministério Público), está prisioneiro de um edifício que nem sequer instalações condignas para salas de audiências possui, tendo   de recorrer, quando há disponibilidade para tal, às salas de outros tribunais ( que dão prioridade naturalmente ao seu serviço) e possuindo fora  umas instalações de recurso, que são manifestamente  insuficientes.

Devemos calar-nos perante estas situações? Deve a comunicação social, como voz dos cidadãos, calar-se?   É evidente que não. Pode não resolver, mas temos todos  obrigação de chamar a atenção para esta má gestão dos serviços.

No que toca a Vila do Conde está em marcha um movimento para alertar para o erro que se está a cometer e que pode ainda ser corrigido se houver visão e vontade política de o resolver. E o polo pode ficar noutro município do Norte , se o de Vila do Conde não for capaz de o acolher em boas  instalações.  

Em Braga, por sua vez, já é mais do que tempo para haver um movimento sério para instalar o TAF em prédio que  reúna as condições necessárias.

Circula na opinião pública, que houve a possibilidade de instalar devidamente o tribunal, sem custos elevados, desde que o Ministério da Justiça abrisse mão das instalações actuais e de um outro prédio onde funcionam serviços seus, recebendo em permuta boas instalações em prédio construído  para o efeito e em local adequado.

Mesmo que essa solução não seja viável, o que não é de admitir é a manutenção do TAF nas actuais instalações. A justiça administrativa e fiscal goza de má fama, desde logo pela morosidade das suas  sentenças e como é sabido “justiça tardia é injustiça institucionalizada” (Ruy Barbosa)  e se as instalações não resolvem só por si o problema, ajudam e muito.

Braga tem o dever de contribuir para essa solução. É certo que  não cabe aos municípios construir tribunais ou oferecer prédios ao Ministério da Justiça, mas cabe-lhe, sabendo a importância que tem para um município ter bons edifícios públicos e, assim, bons tribunais, agir para encontrar boas soluções, em vez de ficar indiferente como se esses problemas não lhe interessassem. Interessam e muito e um município activo com vistas largas tem meios para ajudar a resolver estes problemas.

(DM-7-8-25)

quarta-feira, 6 de agosto de 2025

Pode o Ministro Fernando Alexandre ser um bom Presidente da Assembleia Municipal de Braga?

O Diário do Minho, de 06 de Julho de 2025, anunciava que, Fernando Alexandre, é o candidato da coligação PSD-CDS à assembleia municipal de Braga e que o candidato sentia muita honra nessa candidatura. Será que o Ministro da Educação, Fernando Alexandre, é uma boa escolha para presidente da assembleia municipal?

                                            Não

A resposta que imediatamente ocorre é não, pois, uma vez eleito, não pode cumprir os deveres que cabem a um presidente da assembleia municipal. Este deve, antes de mais, dispor de tempo para bem exercer o seu cargo, o que não é manifestamente o caso de um Ministro.

O presidente da assembleia municipal  deve acompanhar de perto a organização e funcionamento da assembleia municipal a que preside, precisa de estar muito a par dos concretos problemas do seu município, cabe-lhe dar o apoio devido aos diversos grupos municipais em tudo o que eles precisarem. Precisa também de presidir às sessões ordinárias e extraordinárias, não devendo estas ser marcadas em função da sua agenda, mas da disponibilidade dos membros da assembleia municipal, e deve  presidir ou acompanhar a atividade das comissões permanentes que a assembleia municipal deve ter.

Pode, apesar de tudo isto, o Ministro Fernando Alexandre ser um bom presidente da assembleia municipal?

                                                           Sim

Pode, mas tem de o demonstrar com atos e compromissos que deve assumir desde já.

Antes de mais, porque não terá manifestamente  tempo para bem exercer o cargo de presidente da assembleia municipal, deve escolher um número dois que o substitua capazmente e faça tudo aquilo que ele não pode fazer.

Mas não basta. Ele deve deixar marcas muito  positivas do exercício do seu mandato. Enunciamos algumas que nos parecem essenciais.

Deve assumir o compromisso de que  incluirá na mesa da assembleia municipal um membro da oposição, mesmo que, por virtude dos resultados eleitorais, a tal não seja obrigado, garantindo uma maior imparcialidade da mesa.

Deve também anunciar que a assembleia municipal irá passar a ter comissões permanentes sectoriais, tais como urbanismo, finanças, contratação pública e outras, para que os assuntos pertinentes passem pela apreciação destas comissões antes de subirem a plenário da assembleia, enriquecendo o debate nesta.

Deve anunciar e prometer que a assembleia municipal passará a ter um orçamento próprio adequado (atualmente a assembleia municipal pesa, em regra, no nosso país, apenas 0,1% do total do orçamento) para que, quer a mesa, quer os grupos municipais, tenham pessoal de apoio próprio e qualificado de sua confiança (já é assim em Lisboa e é prática corrente em Espanha). Este pessoal terá por missão dar apoio aos membros da assembleia municipal, para que estes, ao trabalharem em comissão ou em plenário, estejam devidamente informados e preparados.

O presidente da assembleia municipal deve anunciar e prometer que a página oficial do município,  terá um espaço dedicado à assembleia e sob a responsabilidade da mesa desta e, nesse espaço, conferir aos diversos grupos municipais a possibilidade de terem também eles um espaço próprio devidamente regulado para tratar dos problemas do município. A criação de uma página oficial própria da assembleia com estas características pode ser também uma alternativa.

 Acresce que pode e deve ainda , como membro do governo, não só contribuir para modificar a lei das autarquias locais, de modo a tornar regra  o que acabámos de escrever, mas também contribuir para de uma vez por todas se cumprir o artigo 239, nº 3 da Constituição, que espera, há mais de 25 anos, para ser regulado e que inclui nomeadamente a destituição da câmara municipal por aprovação de uma moção de censura.

                                                           Conclusão

Se, uma vez eleito , o professor Fernando Alexandre, por quem tenho particular estima, assim proceder durante o seu mandato, terá valido a pena ser eleito e terá dado bom exemplo a todos os presidentes das assembleias municipais do país, sejam ministros ou não.

De outro modo, se for mais um presidente da assembleia municipal nominal, presidindo às suas sessões, quando puder, escolhido fundamentalmente para arranjar votos, constituirá mais um exemplo de mero populismo e de oportunismo eleitoral que empobrecerá a democracia e mais concretamente a democracia local no país, em vez de a enriquecer, como é seu dever.

(DM- 10-7-2025)


quinta-feira, 26 de junho de 2025

Preparar as eleições locais

A preparação de eleições locais para ter êxito deve fazer-se com tempo e com um plano, principalmente se o ponto de partida é a oposição, tendo  presente que não há democracia sem oposição.

O tempo significa que não é à última hora que se prepara um programa e listas para concorrer com sucesso. O tempo mais propício é logo após as últimas eleições e consequente análise dos resultados. No caso de não se aproveitar todo esse tempo entre eleições, então, pelo menos, há um limite mínimo de um ano e meio antes da data provável de próximas  eleições (neste ano, fins de setembro, princípios de outubro de 2025).

E o que deve fazer-se nesse ano e meio? A primeira tarefa é organizar uma equipa, de preferência, já com um líder, que deverá começar por reunir regularmente (mensalmente pelo menos), estudando os problemas do município ou da freguesia (vamos centrarmo-nos neste texto mais nos municípios do que nas freguesias), nos seus diversos domínios de ação e analisando as falhas da maioria que está no governo do município.

Através desse estudo, a equipa saberá preparar um programa de ação a expor em devido tempo. Um programa com conteúdo para convencer os eleitores e tendo em conta que os eleitores não se convencem à última hora e à pressa, ou seja, três meses antes da data das eleições.

As listas de oposição, seis meses antes das eleições, devem ter preparado não só o programa, mas também obtido o nome dos candidatos a vereadores e dos principais membros da assembleia municipal (pelo menos o candidato a presidente e o líder do grupo municipal).

Ter uma lista bem constituída e um programa a seis meses de eleições é o mínimo que se pode pedir a uma lista para obter êxito, mas não é suficiente. É preciso que a lista e o programa sejam dados a conhecer aos eleitores e para isso é preciso, ao mesmo tempo, ter trabalho feito nas freguesias, ou seja, paralelamente trabalhar nas freguesias de modo a que seis meses antes das eleições exista  também em cada freguesia do concelho uma lista e um programa relativo à respetiva freguesia, sabendo-se pelo menos quem é o candidato a presidente da junta de freguesia e quem o acompanha.

Esta fase do convencimento dos eleitores é essencial e o melhor modo de o fazer não é com “outdoors” ou folhetos avulsos de última hora, ainda que estes possam ajudar de algum modo. O melhor meio de chegar aos eleitores é ter nos diversos lugares da freguesia (ou praças, ruas e avenidas caso se trate de freguesias urbanas) pessoas, alinhadas com as listas, a divulgá-las e dá-las a conhecer de preferência pelo método do “passa a palavra” e de reuniões mais ou menos informais a nível local. Se não se chegar aos eleitores, de preferência pessoalmente, o êxito da lista em eleições locais é pouco provável.

Como se pode ver, isto dá trabalho e precisa de tempo, necessitando ainda que a equipa (partido, coligação, ou movimento independente) que esteja no governo do município tenha cometido erros suficientes e graves, denunciados em devido tempo, para criar contra ela um ambiente desfavorável. Se a equipa do governo municipal em exercício for forte, mesmo uma oposição igualmente forte terá sérias dificuldades para a destronar.

E se a lista principal de oposição tiver chegado a esta altura, ou seja, pouco mais de três meses das eleições e não tiver ainda a lista constituída e o programa (um sucinto e outro mais detalhado) devidamente elaborado e, por isso, não estiver ainda no terreno a trabalhar como deve? Se tal suceder então tem muito pouco tempo para agir (não deve contar muito com o mês de agosto) e o melhor é preparar-se para se lamentar do resultado eleitoral que vai obter. Claro que pode haver exceções e resultados surpreendentes, mas é melhor não jogar na lotaria.  Será muito interessante depois das eleições, verificar as explicações para os respetivos resultados obtidos, positivos ou negativos.

(DM-26-6-25)

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Os partidos que se cuidem


Causa tristeza ver como se encontram organizados, a nível local, os partidos que são pilares da democracia em que vivemos, vai para cinquenta anos.

Os partidos, principalmente, os principais partidos que chegaram aos nossos dias abriram-se, nos primeiros tempos, à sociedade envolvente e atraíram muitos cidadãos e cidadãs de elevada qualidade cívica bem representativos das respectivas comunidades. Com o andar dos tempos, esses partidos foram-se fechando.  E  passaram a ser feudos de membros que pouco mais se preocupavam do que com a distribuição de cargos e a escolha ou indicação de candidatos de confiança para eleições nacionais ou locais. São partidos que praticamente adormecem no período entre eleições e só acordam tarde a más horas, quando as eleições se aproximam.

Frequentemente, há, dentro deles, desentimentos e lutas internas exactamente por causa dos cargos e dos candidatos, obrigando as direcções nacionais dos respectivos partidos a intervir, muitas vezes sem êxito,  para sanar conflitos.

Os problemas agravaram-se quando em 1997 os dois principais partidos, depois de, em revisão constitucional desse ano, abrirem – e muito bem – a apresentação de listas para os municípios a cidadãos independentes (grupos de cidadãos eleitores) terem dado, sabe-se lá porquê, um “tiro no pé” ao permitirem que militantes seus passassem da noite para o dia a poderem formar listas de “independentes”, provocando cisões partidárias e desvirtuando a ideia que presidiu â abertura de candidaturas a verdadeiros independentes, ou seja, a não militantes de partidos.

Isto teve um efeito muito negativo que foi o de tornar turvas as listas de  independentes  (grupos de cidadãos). A partir desta revisão constitucional e da Lei Orgânica n.º 1/2001, de 14 de agosto que lhe deu forma, dificultou-se  a distinção entre verdadeiras listas de independentes, ou seja, de cidadãos que tendo as suas ideias políticas bem firmes, não estavam filiados em partidos,  de falsas listas de independentes, porque, na verdade,  eram apenas listas de ressabiados com o partido de que faziam parte e pelo qual queriam candidatar-se, sem êxito.

Os efeitos dessa lei com quase 25 anos mantêm-se - o que se deplora -  uma vez que as listas de verdadeiros independentes fazem falta no nosso país para suprir lacunas que resultam de más listas de partidos. Não se ignora que tais listas não são boas, nem têm sempre  êxito só porque são independentes, mas tem-se presente que são uma porta aberta para o enriquecimento da democracia.

Uma porta aberta que, no entanto, necessita de cidadãos activos, que prezem a democracia e se organizem em devido tempo para tornar mais ampla a escolha dos eleitores.

Para as próximas eleições locais que  decorrerão em fins de setembro ou princípios de outubro deste ano, o “devido tempo” praticamente  já passou para listas que se queiram organizar.  Será preciso uma corrida contra o tempo e o Governo tarda em marcar o dia certo das eleições, como deve e jã pode fazer.

De qualquer modo, a Comissão Nacional de Eleições publicou um Manual  de Candidatura  de Grupos de Cidadãos Eleitores de muito interesse prático que  está facilmente disponível online e tem ainda actualicade.

Link:

https://www.cne.pt/sites/default/files/dl/2021_al_manual_candidatura_gce_v4.

(DM-12-6-25)

quinta-feira, 29 de maio de 2025

O Exemplo de Joaquim da Silva Loureiro

             Joaquim da Silva Loureiro, advogado e famalicense por residência (devemos lembrar-nos que é tanto ou mais famalicense quem aqui nasce como quem aqui reside por muitos e longos anos), foi eleito presidente da Assembleia Municipal no mandato de 1985 a 1989.

No exercício do seu cargo, solicitou à Câmara Municipal que remetesse ao membro da Assembleia Municipal Manuel Barbosa da Silva (CDU)  a documentação que ele insistentemente pedira e a que tinha direito (mapa do quadro de pessoal do município). 

A Câmara Municipal, que era do Partido Socialista, resistiu a tal envio e Joaquim Loureiro teria de tomar uma de duas atitudes: inclinar-se perante a vontade da Câmara que era do seu partido ou cumprir o seu dever como Presidente da Assembleia Municipal.

Joaquim da Silva Loureiro, um dos fundadores do partido Socialista  em Famalicão, perante a recusa reiterada da Câmara Municipal, pura e simplesmente renunciou ao seu mandato.

Nunca ao longo destes quase  50 anos de democracia local em Famalicão, um Presidente da Assembleia Municipal tomou esta atitude e estou convencido  de que, mesmo no nosso país, poucos presidentes  a terão tomado.

Isto é publicado no dia (29.5.2025) em que comemoraria 89 anos se vivo fosse e é uma homenagem que bem merece,  devendo  servir de exemplo para todos os democratas. Até porque esta recusa de entrega de documentos por parte da Câmara Municipal a membros da Assembleia Municipal não foi um pecado isolado da Câmara de então, constituindo uma ilegalidade frequente que chega aos nossos dias.

Entretanto, com pena o digo, pretendi encontrar documentação sobre este   pedido de renúncia no arquivo da nossa  Assembleia Municipal e não consegui. Apenas me foi fornecida  cópia da ata da sessão ordinária de 3 de fevereiro de 1989 que diz que, nesse dia, pelas 21,30h e no Salão Nobre dos Paços do Concelho  reuniu a Assembleia Municipal, tendo no primeiro ponto da ordem de trabalhos a eleição do Presidente da Assembleia Municipal.  Mais dizia a ata que a  mesa foi presidida por Carlos Alberto Oliveira de Sá na “ausência do titular que tinha renunciado ao mandato”.

Bem pedi para me entregarem o pedido de renúncia, pois não se renuncia por boca, mas não consegui obtê-lo, apesar dos esforços feitos pelos serviços da Assembleia Municipal. A documentação  deste órgão do município, nos primeiros tempos e praticamente até ao fim do século passado, está num estado que não nos honra como famalicenses. Importa que ela seja tratada com o cuidado devido,  desde o início, ou seja,  desde 1976.

(Notícias de Famalicão, 29-5-2025)

quinta-feira, 15 de maio de 2025

A Beleza da Democracia

Para quem, na esteira da conhecida e irónica frase de Churchill, considera que  a democracia é “o pior dos regimes excepto todos os outros”, afirmar a beleza da democracia aparecerá como algo despropositado. E, no entanto, se bem pensarmos, a democracia é o melhor e mais belo dos regimes que até hoje conhecemos. Justificar esta afirmação no espaço que me é reservado neste jornal é um exercício difícil que, no entanto, tentarei fazer, porque considero um dever.

A democracia tem na base uma convicção firme de que todos nós, pessoas, somos iguais em direitos e deveres. Esta afirmação é compatível com uma  outra que diz o contrário, ou seja, que todos somos diferentes, Não há uma pessoa igual a outra. Somos todos diferentes do ponto de vista  físico e mental. Mas essa diferença  não nos dá o direito de a invocar, quando ela nos beneficia, para oprimir aquelas ou aqueles que têm menos força ou inteligência ou saúde.

É aqui que entra a democracia. É democrata aquela ou aquele que olha para o outro como semelhante, como igual, e que o respeita como tal.  Repare-se que isto não é natural, é antes uma convicção assente, para quem tem fé cristã, na ideia de que todos somos filhos de Deus e, portanto, irmãos, e para quem não a tem na ideia de que os seres humanos merecem todos igual respeito, não havendo supremacia de uns sobre outros, porque fazem todos parte da família humana.

Sabemos que nem todos pensam assim. E que há pessoas que se consideram, por razões de força física ou de superioridade moral, desde logo, baseada na inteligência, acima de outros e que, por isso, estes lhes devem obedecer e até se atrevem a dizer que devem obedecer (submeter) para seu bem…

Estas pessoas afastam-se da democracia e tratam de impor a sua vontade. Constroem um regime político baseado na superioridade de uns sobre outros. Arrogam-se o direito de mandar e não suportam a ideia de igualdade.

A beleza da democracia está aqui. Os democratas, que o são, de verdade ,  constroem um regime baseado na igualdade de todos e, por isso, um regime político nos termos do qual o direito de mandar é-lhes dado pelos seus iguais, através de eleições. Uma vez eleitos passam a representá-los, não a dominá-los. Estão ao serviço das cidadãs e dos cidadãos e de tal modo que não só periodicamente lhe pedem de novo o poder de mandar, como, ao longo do mandato, prestam  contas.

Mas essa beleza continua através do facto de em democracia as ideias diferentes serem respeitadas, desde que não atropelem os direitos e a dignidade de outros. Onde não há respeito pela oposição, não há democracia.

E a beleza da democracia manifesta-se finalmente  quando a sociedade que dela resulta é livre, justa e solidária; quando não há descanso enquanto o outro, o nosso semelhante  não tem a vida digna que desejamos para nós.

Por isso a democracia, está sempre em movimento e em construção , é um constante trabalho de aperfeiçoamento, tendo em vista essa sociedade mais livre mais justa e mais solidária em que os mais vulneráveis são ajudados e os mais dotados estão ao seu  serviço.

A democracia é uma partilha e a construção de uma fraternidade que lhe serve de guia. Trata-se de um objectivo nunca plenamente alcançado, mas sempre tentado.

quinta-feira, 1 de maio de 2025

Transporte Ferroviário Braga-Porto

A remodelação da linha ferroviária entre Braga e Porto (mais correctamente  Ermesinde) ocorrida em 2004 trouxe um avanço na ligação entre as duas cidades que ainda não está completo, nem da qual se tiraram as vantagens que se esperavam.

Não está completo, porque entre Ermesinde e Contumil há apenas duas linhas, uma no sentido norte-sul e outra no sentido inverso e isto provoca um estrangulamento que não é de admitir que se mantenha.

A Ermesinde chegam obrigatoriamente comboios Alfa, Intercidades, Regionais e Urbanos que vêm de Vigo/Valença, de Braga, de Guimarães e da linha do Douro e que estão limitados na progressão da sua marcha ou dos seus horários por causa desta limitação . Como é possível que esta situação não se resolva?

E como se isto não bastasse os comboios Urbanos rápidos que de Braga, Guimarães e da linha do  Douro  se dirigem ao Porto param até chegara a Campanhã nas estações de  Águas Santas, Rio Tinto e Contumil.  A que título num comboio rápido?  Só é rápido até Ermesinde?

Um alargamento da linha entre Ermesinde e Contumil  poderia permitir até que houvesse comboios para o serviço dos utentes moradores entre Campanhã e Ermesinde, libertando a viagem dos passageiros que pretendessem dirigir-se para distâncias mais longas.

Acresce que  a CP parece não ter em devida conta conta que os comboios Alfa e Intercidades que partem, por exemplo,  de Braga vão naturalmente com muitos lugares vagos, pois só enchem no Porto. A que título não ocupar esses muitos lugares vagos  - na medida das possibilidades – entre Braga e Porto a um preço atractivo e não aos preços actuais  de 17,50 euros (Alfa) e de 13,50 euros (Intercidades) e que não tem em conta no seu valor, por exemplo, a entrada em Famalicão?

Um preço atractivo – sem prejudicar os passageiros que se destinassem a maiores distâncias – tinha, ao mesmo tempo, a vantagem de gerar mais receita e retirar automóveis da estrada. A CP despreza essas receitas e os benefícios que traria para o ambiente?

Sei que se misturam neste artigo assuntos da  IP e da CP,  mas não trabalham elas para o mesmo fim? Precisam uma e outra  de se entenderem e não se compreende que a CP não convença a IP a suprimir, no mais breve prazo,  o estreitamento da via a partir de Ermesinde e que a IP não estimule a CP a utilizar com melhor proveito  as vias que põe ao seu dispor.

Ambas devem servir cada vez melhor os cidadãos e cidadãs deste país e não é essa a ideia que transparece.

(DM- 1 - 5- 25)

 

 

 

 

quinta-feira, 3 de abril de 2025

Candidatemo-nos!


O título podia ser “Candidatem-se” e ser um apelo dirigido às cidadãs e aos cidadãos para se candidatarem às próximas eleições, integrando listas que tenham por finalidade trabalhar por uma sociedade mais livre, justa e solidária, como é nosso dever. No entanto, o título é outro e o apelo não nos deixa de fora, numa situação cómoda, mas envolve-nos.

Não é vulgar o apelo à candidatura, aparecendo como mais vulgar o apelo ao voto. Mas o apelo ao  voto sem bons candidatos não é  bom. É como dizer:  na falta de melhor, votemos, ao menos nas listas e nos candidatos menos maus.

Daí a importância da candidatura. Apliquemos o que acabamos de dizer.

É desejável e mesmo um dever candidatarmo-nos, sendo essa uma forma de “amor político”, bem clara para os cristãos,  mas igualmente  aplicável também a não crentes que têm amor pela humanidade.  Claro que não é candidatarmo-nos a qualquer eleição. Cada um verá da sua capacidade, devidamente apreciada por si e por aqueles que os conhecem, para se candidatar a uma eleições.

Curiosamente, neste nosso país e neste nosso momento estão próximas eleições para quase todos os lugares previstos na Constituição: eleições para o parlamento ( Assembleia da República), para as autarquias locais e para o  Presidente da República.  

Cada um de nós deverá saber das suas capacidades e das suas circunstâncias. A candidatura deve ser um acto racional e não é para qualquer um de nós candidatar-se a Presidente da República. É um dever sim, mas para as cidadãs e os cidadãos que sejam reconhecidos por nós cidadãos e cidadãs como tendo as qualidades necessárias para o desempenho de tão alto cargo. É por isso também um dever não nos candidatarmo-nos a cargos para que não estamos devidamente preparados.

Também a candidatura à Assembleia da República não deve ser um dever para todos, mas antes para aqueles que, sem a exigência própria  da Presidência da República,  estejam preparados para exercer um cargo que é da maior relevância (ser membro do Parlamento) e que, com os seus 230 membros, tem muito mais poder que o próprio Presidente da República. É da maior importância termos bons candidatos para as eleições que se aproximam (18 de maio). Normalmente,  os candidatos à Assembleia da República são escolhidos pelos partidos sem consultar os cidadãos, mesmo  que informalmente, mas  estes têm o direito e o dever de “interferir” nos partidos em que  costumam votar no sentido de escolherem  aqueles que consideram os melhores candidatos para o “seu” partido. Essa interferência pode mesmo exprimir-se por uma crítica pública às escolhas feitas.

Resta a eleição para as autarquias locais. É aqui que o dever de candidatura abrange mais pessoas (largas dezenas de milhar) e não se exige tanta responsabilidade e preparação, ainda que estas sejam também necessárias. Participar numa assembleia ou câmara municipal, numa assembleia ou junta de freguesia é importante e uma forma de exercer o “amor político” que as encíclicas “Laudato sì” e “Fratelli Tutti” exprimem muito bem. Pode parecer algo com pouca importância, mas não é. Além do mais, são os lugares que mais possibilitam estar próximo dos mais próximos nos momentos bons e maus.

                                                           António Cândido de Oliveira

PS – Nas recentes eleições para o Conselho Geral da Universidade do Minho dos 20476 estudantes inscritos nos cadernos eleitorais votaram 1985 ou seja menos de 10%. Mais de 90% de abstenção! Isto não interpela os órgãos da Universidade? Ficam indiferentes? Tencionamos abordar este assunto.

(DM - 3-4-25)

quinta-feira, 20 de março de 2025

Somos um povo de cabeça dura, D. José!

No passado sábado, dia 16 de março de 2025, D. José Cordeiro, que presidia em Braga  à missa de funeral do Dr. Miguel Macedo, largamente participada, enchendo a Igreja de São Lázaro, fez, durante  a bem adequada homília o elogio da política, lembrando a Laudato Sì do Papa Francisco. Um elogio rasgado, chegando a dizer que o “amor é político”  e levando-me a reler a Encíclica que tem como subtítulo “Sobre o Cuidado da Casa Comum” .

Só que não sei se D. José conhece bem - certamente conhece - o povo de Deus que lhe coube em Braga. O povo de Deus, de que faço parte, não tem em boa conta a política.  Considera que os políticos são todos iguais, que vão para a política,  ora porque não sabem fazer mais nada, ora para encher os bolsos. Vão para se servir, não para servir o povo.  A regra da política é a sujidade e o povo de Deus diz, mesmo quando surgem outros eleitos, que estes mudam, mas a porcaria (utilizam outra palavra mais vulgar) é a mesma. E a ladainha corrente contra os políticos ainda vai, nesta brevíssima descrição, a meio.

Julgo não estar a exagerar. Ainda admite, o povo,  que haja um ou outro que não pertença a estas categorias, mas consideram-no um ingénuo, alguém que não vai longe na política. E grande parte do povo de Deus, mesmo aquele que vai à missa todos os domingos, nem sequer vota. Votar para quê? São todos iguais, repete. E muito menos se dispõem a integrar uma lista de candidatos, recusando mesmo participar, quando são convidados, pois não querem misturar-se com essa “gente”.

E, no entanto, ao ler a Encíclica,  que vale a pena ler com toda a atenção,  não por ser do Papa Francisco, mas por nos apresentar  o Evangelho à luz dos nossos dias , deparamos no n.º 228 com este trecho: “O cuidado da natureza faz parte de um estilo de vida que implica capacidade de viver juntos e de comunhão. Jesus lembrou-nos que temos Deus como nosso Pai comum e que isso nos torna irmãos”, com o consequente dever que temos, de amor fraterno. E no n.º 231: “ O amor, cheio de pequenos gestos de cuidado mútuo, é também civil e político, manifestando-se em todas as ações  que procuram construir um mundo melhor. O amor à sociedade e o compromisso pelo bem comum são uma forma eminente de caridade, que toca não só as relações entre os indivíduos, mas também “ as macrorelações como relacionamentos sociais, económicos, políticos”. Por isso, a Igreja propõe ao mundo o ideal de uma civilização do amor”.

Somos D. José, um povo de “cabeça dura” que se preocupa com ter poder, dinheiro e glória e, se para isso for necessário desqualificar ou  esmagar os  seus irmãos, não hesita. E ai de quem fale em aumentar a família com mais filhos, pois estorvam a sua  boa vida. E, muito menos com irmãos vindos de fora, de outras terras, de outras culturas, pois não são como nós. Quanto à “irmã Mãe Terra”, ela continua a clamar “contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável e do abuso dos bens que Deus nela colocou”(LS, n.º2)

Cumprir o Evangelho e com ele a doutrina social da Igreja bem adaptada ao nosso tempo em recentes documentos papais, e ainda por cima, a “Laudato Sì” seria uma revolução pacífica que mudaria tanto a vida do povo de Deus e obrigaria a mudar tanto o seu comportamento, que o melhor é deixar tudo assim. E continuar a ir à missa, cumprindo os preceitos…

Somos um “povo de cabeça dura”, D. José!

(DM-13-3-25)

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2025

Freguesias: a contextualização necessária

A nossa organização administrativa local assenta fundamentalmente nos municípios e não nas freguesias. Sempre assim foi, completando-se, a partir do Liberalismo, com o distrito, a nível supramunicipal, e com as freguesias, a nível inframunicipal.

O nível supramunicipal, desde a criação dos distritos em 1835, manteve-se quase sempre até à Constituição de 1976 e teve três momentos altos com os Códigos Administrativos descentralizadores, de Passos Manuel, em 1836, e de Rodrigues Sampaio, em 1878, e com a Constituição de 1911. A Constituição de 1976 prometeu (decretou!) a região administrativa como nível supramunicipal, mas não cumpriu. Nem sequer a experiência se fez, num claro retrocesso centralizador.

Por sua vez, a freguesia entrou na organização administrativa em 1836, manteve- se, com destaque, nos Códigos de Passos Manuel e de Rodrigues Sampaio e atingiu o seu momento mais alto – que se mantém - na Constituição de 1976 e na legislação subsequente que a concretizou e aprofundou.

Para a centralidade do município na administração pública portuguesa muito contribuiu a reforma territorial de 1836, da responsabilidade de Passos Manuel (e da sabedoria do Coronel Franzini), que reduziu o número de municípios de cerca de 800 para cerca de 350. A razão foi simples e consta do conciso, mas notável, relatório que acompanha o mapa anexo ao Decreto de 6 de Novembro de 1836:era necessária a existência de municípios que não fossem muito pequenos, pois não teriam rendimentos para o seu bom funcionamento, nem sequer pessoal para ser eleito, nem demasiado grandes, pois boa parte da população estaria demasiado afastada da sede do concelho. 

A reforma foi-se aperfeiçoando e os municípios diminuíram ainda mais.

Com esta reforma territorial dos municípios, Portugal adiantou-se, mais de um século, a muitos países da Europa. Foi depois da Segunda Guerra Mundial que Estados do Norte da Europa, também eles com excessivo número de municípios e pelas mesmas razões que nortearam a nossa reforma de 1836, fizeram uma forte redução do seu número. Assim sucedeu, entre outros, com a Bélgica, a Holanda, a Dinamarca, a Suécia e a então Alemanha Ocidental. Ficaram para trás, sem reforma e com um elevadíssimo número de municípios, a Espanha e a Itália (mais de 8000 municípios, cada) e a França, com 35.000 municípios. Todos com larguíssimos milhares deles com muito menos população e território do que as nossas freguesias.

Assim se compreende que Portugal tenha freguesias e nestes países, tão próximos, não existam. Na verdade, temos freguesias porque temos municípios grandes e elas têm por finalidade ajudar a melhor governar o nosso país, resolvendo, dentro do âmbito municipal problemas locais de proximidade que exigem presença física ( e tantos são) e reivindicando, junto dos municípios e, se necessário, junto do Estado, a resolução de problemas locais que, ora pela sua complexidade, ora pela exigência de recursos humanos e financeiros, não estejam ao seu alcance.

É por essa razão que as freguesias são necessárias, não devendo ser muito grandes nem muito pequenas. Muito grandes, assemelham-se a municípios, e não é essa a sua função. Muito pequenas, assemelham-se a aldeias, nas zonas rurais, ou constituem pequenos núcleos residenciais, nas zonas urbanas. Ora, as freguesias precisam de suficiente dimensão populacional e territorial para cumprirem a sua missão.

A reforma recente delas deveria ter seguido, pois, o critério de Passos Manuel e não o do corte percentual de freguesias por município, de Miguel Relvas, que teve consequências que não foram boas. Trata-se agora de corrigir erros desta reforma, sem pôr em causa os méritos que também teve.

(Público online de 28-2-25)


quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

Eleições Locais: a Importância das Candidaturas


               Realizam-se este ano,  entre 22 de Setembro e 14 de Outubro de 2025, as eleições locais gerais para municípios e freguesias e que são conhecidas correntemente como eleições autárquicas.

               Como se vê, desde já, os meios de comunicação social dão muito mais atenção às eleições para Presidente da República que se deverão realizar em 25 de Janeiro de 2026. Há aqui uma sobreposição que vai fazer diminuir a atenção devida às eleições locais o que não é bom, pois estas eleições são do maior interesse para o bom governo de municípios e freguesias.

               Para este bom governo é melhor dar maior atenção às pessoas que aos partidos e,  de entre as pessoas não só aos cabeças de lista mas à equipa e ao programa que apresentam. Se os partidos tradicionais não apresentarem boas listas não se estranhe que surjam resultados estranhos.

               Desempenham aqui um papel da maior importância as cidadãs e os cidadãos que prezam a democracia entendida como um regime baseado na dignidade da pessoa humana e que procura o bem comum. Cidadãos e cidadãs de gerações novas mas sem menosprezar os que já têm da Vida muita sabedoria.

               Estamos a viver tempos muito confusos em que vemos subir a lugares cimeiros de importantes países pessoas que não gostaríamos de ver sequer, desde logo por falta da necessária dignidade, à frente de um nosso município ou  freguesia.  É nestas circunstâncias que é dever agir, por parte de todos os que se reveem na democracia e a sabem distinguir de regimes ditatoriais ou autoritários .

Essa acção muito  antes de se exprimir no voto deve passar também pela disposição para participar em listas de candidatos que defendam os direitos fundamentais das pessoas. Essa participação tanto pode ocorrer nos lugares cimeiros das listas como noutros menos exigentes, mas também importantes, porque faz falta neles  a voz sensata de pessoas que lutam por uma sociedade melhor para todos e porque não devem ser preenchidos por quem não tem qualidades para tal.

Se os partidos democraticos tradicionais não se aproximam dessas pessoas, procurando integrá-las nas suas listas, então será bom que se formem listas de grupos de cidadãos independentes  (e não de ressabiados por não serem candidatos cimeiros pelo seu partido) que tragam novidades e possibilitem uma boa escolha. Aqui é preciso apelar  especialmente à gente nova. Não fiquemos indiferentes perante as eleições que se avizinham.

PS – Tutti Frutti – A democracia precisa de partidos fortes. Mas os partidos podem dar cabo da democracia. Os dois maiores partidos portugueses ( e os restantes)  precisam de ser exemplos de democracia. A meu ver, não são. Tentarei, oportunamente, fundamentar esta afirmação.

(DM-6-2-25)

sábado, 18 de janeiro de 2025

A Democracia é prestação de contas

            A democracia é o regime em que o povo mais ordena. Ou ainda, na expressão de A. LINCOLN,  “o governo do povo, pelo povo e para o povo”. É preciso dizer e repetir isto.

Mas também é preciso dizer e repetir que o povo não ordena de qualquer modo. Não é democracia o povo em turba a entrar pelos edifícios e pelos gabinetes de quem está a exercer cargos políticos e tomar o lugar deles, quando não expulsá-los ou  agredi-los. Tenha-se presente, como imagens fortes da negação da democracia, a invasão do Capitólio, nos Estados Unidos da América ou o assalto ao Palácio do  Planalto, no Brasil.

O povo governa em democracia através de representantes que escolhe em eleições a nível nacional, regional  ou local, porque não é possível  governar directamente (tal só seria  possível em pequenas comunidades de que temos exemplo histórico Atenas).

Só que para haver democracia é preciso que os eleitos tenham perfeita consciência de que não são donos do poder, são representantes dos cidadãos -  isso mesmo: representantes -  e como tal têm o dever de prestar contas perante os titulares do poder -  os cidadãos. Prestar contas sempre que o povo (os cidadãos) lhas pedir e não de quatro em quatro anos, como alguns julgam.

A democracia representativa tem um complemento fundamental que é o direito de  participação dos cidadãos (a que frequentemente se chama democracia participativa) e, no exercício desse direito, os cidadãos directamente ou através de associações cívicas  ou ainda através dos meios de comunicação social ( que são também voz do povo), podem e devem pedir contas aos seus representantes ( aos seus mandatários).

E pede-se contas, por exemplo, fazendo perguntas sobre o modo como está a exercer o poder em nome do povo, que actos está a praticar, ou não praticar,  e porquê. Se os representantes que exercem o poder não prestam contas, não respondem às perguntas que lhes são feitas, negam a democracia. Tornam-se autocratas.

Trazido isto para o nível local e nomeadamente municipal, quando, por exemplo,  um cidadão ou um meio de comunicação social se dirige ao presidente da câmara ou a um vereador, pedindo entrevistas ou fazendo perguntas, solicitando documentos ou a sua consulta, e não obtém resposta ou ela tarda  para ver se esquece, ele merece forte crítica ( e não se deve queixar) porque está a violar a democracia.

E mais grave é ainda se esses representantes não tem consciência disso, pois então não sabem o que é a democracia e não merecem ocupar o lugar que lhes foi concedido.

(Notícias de Famalicão - 18-1-2025)

quinta-feira, 2 de janeiro de 2025

Arcos e Barca: e porque não?


 O Alto Minho de 3 de Janeiro de 2025 titulava a toda a largura, na página 21,  colocando estas palavras de Alfredo Dantas, arcoense da diáspora: “Se Arcos e Barca fossem um concelho único era muito melhor.”

Fui ver alguns dados sobre estes dois concelhos e verifiquei que Arcos de Valdevez tem uma superfície  de 447 Km2 e uma população de  cerca de 21.000 habitantes e Ponte da Barca tem uma superfície de 182 Km2 e uma população de 13.000 habitantes ( dados de população em ambas de 2021).

Ora se juntássemos os dois ficaria um concelho de cerca de 630  Km2 com uma população de 34.000 habitantes, ou seja,  concelho muito mais forte. Na superfície,  ultrapassaria a média do país que é de cerca de 300Km2 por concelho, mas é de ter em conta que muita parte desse território seria na serra e em população um concelho com 34.000 habitantes é outra coisa.

E já se reparou bem que as sedes dos dois concelhos são vizinhas? E que muitas vantagens adviriam em recursos humanos, financeiros, urbanismo e ordenamento do território entre muitas outras?  Haveria desvantagens, certamente. Mas aquelas  não superariam estas?

Não conheço bem os dois concelhos, não sei as rivalidades que há entre eles ( mas se as há,  isso é coisa que passa e é argumento pobre), mas sei  - e defendo -  que os concelhos devem ser fortes. Portugal precisava de uma reforma dos municípios de modo a termos concelhos sempre que possível a rondar os 50.000 habitantes e nunca com menos de 20.000 habitantes. Isso nem sempre será possível no nosso país por termos, principalmente no interior,  muito território e pouca população, mas deverá fazer-se  nas restantes situações e Barca e Arcos é um exemplo claro.

De que se está à espera para formar um movimento nesse sentido ( por informal que seja)  com naturais de um e outro concelho, mesmo da diáspora, formando sem pressas uma opinião pública favorável nesse sentido?

Importa dizer que ao mesmo tempo que defendemos concelhos fortes não defendemos freguesias grandes. As freguesias não são, nem devem ser  pequenos municípios, mas entes de proximidade que devendo ter uma população mínima (freguesias demasiado pequenas não são adequadas para cumprir a sua missão) não devem ter uma população tal que deixe de falar-se em proximidade (vizinhança). A reforma das freguesias de 2013 só foi má porque foi feita com absurdos cortes percentuais por concelho, juntando freguesias que nunca deveriam ter sido juntas e que agora importa desagregar. Mas isso é outro tema.

Sobre concelhos muito mais haveria a dizer para bem do bom governo do nosso país. Deveriam ter técnicos qualificados e, por isso, devidamente pagos. Os eleitos a exercer a tempo inteiro deveriam também eles ser melhor pagos. A oposição ( sim, a oposição, pois sem oposição não há democracia!) deveria ter uma estatuto que não tem. E muito mais haveria a dizer.

( Alto Minho - 2-1-25)